“A Ternura dos Quarenta” – “Polana” de Rui Baptista

“A Ternura dos Quarenta”

Envelhecer é o único meio de viver muito tempo”.
Albert Camus

Esta minha foto, para constar do então Bilhete de Identidade, foi tirada num estúdio de fotografia existente na Avª. Manuel de Arriaga de Lourenço Marques, onde se localizava o Hotel Universo chamado, com verve macabra, de Hotel Mira-Mortos por ter vistas para o cemitério do Alto-Maé.

Na esquina entre a Avenida Pinheiro Chagas (actual Av. Dr. Eduardo Mondlane) e Manuel de Arriaga (actual Av. Karl Marx). Do lado esquerdo o Hotel Universo, do lado direito a Ronil. Anos 1960. Dada a sua localização em frente ao Cemitério do Alto-Maé, o hotel era jocosamente referido como “Hotel Mira-Mortos”.

Se a memória me não falha” (Vitorino Nemésio) era seu proprietário um fotógrafo de naturalidade belga que tirava fotos do tipo-passe com preocupação artística, logo sem comparação possível com as fotos dos Cartões de Cidadão actuais em que, por exemplo, uma foto de George Clooney se pode confundir com a de um qualquer indivíduo sem sombra de charme!

Aliás, mesmo fotos de estúdio, então impressas a preto e branco com cuidados de iluminação, mereciam, não poucas vezes, por parte das senhoras (e mesmo dos cavalheiros apelidados hoje de metrossexuais) o comentário: “Que mal que estou!”

Isto porque, as pessoas, de uma forma geral, não têm bem estruturado o respectivo esquema corporal julgando-se melhores  do que a sua imagem fotográfica lhes apresenta! Passados tempos, revendo essa mesma fotografia, reconhecem não estarem assim tão mal!

Tinha eu, na altura, desta minha foto, 40 anos de idade, facto que me traz à memória a letra de uma canção de Paco Bandeira (que serviu de título a este meu post), cuja letra reproduzo parcialmente:

Os copos que não bebi
Os discos que não toquei
Os poemas que não li
Os filmes que nunca vi
As canções que não cantei.”

Não adianta deitar contas à vida
A ternura dos quarenta
Não tem conta, nem medida.”

Bem nos avisou um autor de que me não lembro do nome: “Quando se é novo desperta-se paixão, em velho compaixão”. Bem me dizia, por seu lado, um meu amigo: “É a lei da vida, meu caro”.

Lei da vida que nem um pacto com o diabo consegue libertar, romanceada, com mestria, por Oscar Wilde, em “O Retrato de Dorian Gray”.

Comentários: