ÁFRICA DO SUL AGORA SEM MANDELA
Porquê a África do Sul ?
– Tem a maior comunidade lusa em África, – aproximadamente 500 mil portugueses. Eu também podia fazer parte dessa comunidade, porque quando saí de Moçambique foi um dos países que esteve na primeira linha para recomeçar de novo a minha vida. Quiseram o destino e a minha mulher, que o caminho seguido não fosse esse.
Ainda lá tenho amigos de juventude, escola, ex-colegas de trabalho e conhecidos.
– Porque ao contrário do que alguns esperavam, o acto eleitoral de 7 de maio ser o primeiro sem a presença física de Nelson Mandela, estar a decorrer de forma ordeira, cívica e sem incidentes.
(Não era sério da minha parte se não fizesse um breve resenha sobre a era de, e pós Mandela).
- Era Mandela
Com a sua libertação em fevereiro de 1990, assistiu-se à cessação gradual com supervisão da comunidade internacional, do sistema de apartheid para, pela reconciliação entre todos, transformar a África do Sul numa nação multirracial.
Também não tenho memória tão curta, assim!… Recordo-me que após a sua libertação e mesmo durante o seu governo 1994/1999, os grupos mais radicais do partido onde militou, o ANC, à sua revelia, mas gozando de alguma impunidade, sob mando da sua ex-mulher Winnie Mandela, depois de liquidarem barbaramente (todos nos recordamos e sentimos “arrepios de frio, neste caso de calor” ao ver os pneus a arder colocados nos pescoços das “vítimas”) cerca de 3 mil opositores, acusando-os de colaborarem com o regime do apartheid.- Esses radicais pediam insistentemente o fim da reconciliação nacional iniciada por Mandela, para possivelmente lançarem o país no caos e anarquia, sem que nunca o tivessem conseguido.…- É por esta altura que o extremista/racista Peter Mokaba tem a triste frase:
“Wen Mandela dies we will kill you like flies”. (Quando Mandela morrer nós vamos vos matar como moscas).
- Depois de Mandela
Tabo Mbeki e Jacob Zuma presidentes da era pós Mandela, durante os seus mandatos possivelmente por impreparação política, não fizeram as reformas necessárias, e por isso, em pouco ou nada melhoraram a situação:
– O país permanece constantemente sob ameaças de greves em diversos sectores, em especial no mineiro, motor da sua economia, onde em confrontos com as forças da ordem já ocorreram dezenas de mortes. Quem não se recorda da mina de Marikana? Onde num só dia de greve, a polícia abateu a tiro 34 mineiros e feriu 78. Tendo no mesmo local, em dias anteriores abatido 10!
– Os centros urbanos ainda continuam violentos. A criminalidade embora tendo diminuído ainda é muito elevada, cerca de 16 mil homicídios por ano!….
– Devido à instabilidade os grandes meios de produção, o comércio e indústria começaram a definhar, a pobreza e o nível de desemprego continuaram a aumentar entre todas as raças, atingindo segundo números oficiais 25%, mas o real pode chegar aos 40%!!! Naquele que, por ironia do destino é o país com as maiores riquezas naturais do continente africano.
– O erário público foi delapidado em milhões e milhões de randes, alguns deles desviados para a construção do luxuoso complexo habitacional (fotos abaixo) para a família, e amigos do presidente Zuma. O que motivou o tribunal a pedir ao presidente que esse dinheiro fosse devolvido ao estado.
Zumaville, complexo habitacional do presidente Zuma
– O bispo anglicano Desmond Tutu – tal como Mandela e Deklerk, também Nobel da Paz – disse há dias aos sul africanos que o povo tem uma arma preciosa: O voto!! – E que antes de o utilizar ponderassem bem em quem votar!.. Ele, desta vez não vai votar no ANC.
E no próximo dia 7 de maio?
– Em 2004, o ANC conquistou perto de 70% dos votos. Em 2009, com Zuma na liderança, desceu para 63%. – No próximo dia 7 de Maio a sua vitória é certa!
Também já é certo que a sua maioria não será tão expressiva, porque a contestação tem vindo a ganhar voz, ajudada pelo descontentamento social, pelos trágicos acontecimentos na mina de Marikana (34 mortos) e porque apareceram fortes alternativas à hegemonia do ANC, a saber:
– Aliança Democrática (DA) liderado pela antiga jornalista de 58 anos, Helen Zille.
Este partido de ideologias liberais tem a sua base maioritária de apoio nos não negros, e actualmente é o segundo partido da África do Sul. Em 2009 venceu as eleições na província do Cabo Ocidental.
– Pela primeira vez a eleições, aparece o movimento político AgangSA liderado pela empresária e académica Mamphela Ramphele dissidente do ANC,
ex-companheira do activista anti-apartheid Steve Biko assassinado na cadeia em 1977, que lançou este movimento para nestas eleições disputar o poder ao seu antigo partido, e como ela diz: “Salvar a grandeza da nação que está em risco pelo fracasso colossal da governação, contra a cultura da impunidade e do abuso de poder que cresce no movimento outrora liderado por Nelson Mandela”. Conta com o apoio do arcebispo Desmond Tutu.
Este movimento aquando da sua formação tentou fazer um acordo pré-eleitoral com a Aliança Democrática (DA) para concorrerem ás eleições em conjunto,
mas contou com a oposição da sua ala mais radical, dizendo que a DA era o partido dos “brancos”!
– Também de novo aparece a eleições o partido Marxista-Leninista dos Combatentes pela Liberdade Económica (EFF), fundado por Julius Malema ex-líder da juventude do ANC,
donde foi expulso em 2012 pelas suas posições radicais e racistas. Ele mesmo classificado como um revolucionário ao estilo do falecido Hugo Chávez, da Venezuela. Este partido tem por objectivo a nacionalização dos meios de produção, especialmente o sector mineiro.
Para bem de todos, queira Deus que como até aqui e qualquer que seja – em termos de resultados – o desfecho deste acto eleitoral, e após o conhecimento destes, a paz perdure mostrando assim ao mundo que o povo sul africano soube cumprir e honrar o legado de Mandela, e sobretudo soube contrariar a já triste frase do radical Peter Mokaba.
“Para nós com o BigSlam, o mundo já é pequeno”!
João Santos Costa – 02.05.2014
Fontes: Amigos residentes na ÁSul; Jornais diários e Web.
Um Comentário
Rui Baptista
Caro João Santos Costa: Um abraço amigo de parabéns pela resenha política feita sobre a África do Sul do tempo de Mandela, depois do seu falecimento e o seu futuro com as eleições que se avizinham. É um caso a seguir com certo interesse, diria mesmo com preocupação, mercê a numerosa colónia de portugueses que aí se fixaram.