Só para cumprir o amável convite de um antigo aluno e bom amigo da saudosa Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque de Lourenço Marques, “alma pater” do Bigslam, o festejado basquetebolista Samuel Carvalho, me atrevo a responder à entrevista “Conheça Melhor”. Isto porque os formulários respondidos por tantas figuras ilustres das diversas e riquíssimas modalidades desportivas moçambicanas me colocam perante a situação de poder vir a “borrar a pintura”, perdoe-se-me o plebeísmo.
Mas vamos a isto, pedindo, antecipadamente, a benevolência de possíveis leitores.
Meio século separam estas duas fotos de Rui Baptista (1962-2012)
Nome completo: Rui Vasco Júlio Pereira da Silva Baptista.
Alcunha: Sendo conhecido por Rui Baptista (a ter um “nikname” os meus antigos alunos da EIMA o dirão!).
Data de nascimento: 19 de Maio de 1931.
Naturalidade: Nado e criado em Luanda, aos 14 anos vim para a então Metrópole, terra de nascimento dos meus progenitores, por meu pai ter passado a sua quota na Farmácia Central, sita na capital angolana.
Estado Civil: Casado com Maria Carlos Freire de Carvalho da Silveira, que conheci nos meus tempos de oficial miliciano em Tomar.
O meu casamento no Santuário de Fátima (1956), tendo ao lado da minha mulher sua mãe e seu pai, tenente-coronel médico. A meu lado, minha mãe (o meu pai havia falecido no ano anterior).
Altura: 1,76 mt.
Peso: 80 quilos (mantidos através de treinos suados de musculação três vezes por semana).
Profissão: Professor de Educação Física.
Ideologia Política: Direita Democrática.
Crença Religiosa: Católica.
Residência em Moçambique: Em Loureço Marques, vivi inicialmente numa moradia na Rua João das Regras, em frente ao então Governo-Geral, tendo, posteriormente comprado e passado a habitar um 16.º andar no Prédio Invicta, sito no número 108 da Avª Afonso de Albuquerque.
Prédio Invicta na Avª Afonso de Albuquerque
Percurso escolar: Até ao 14 anos de idade, fiz os estudos primários e frequentei o Liceu Salvador Correia de Sá (Luanda) tendo vindo a completar o curso dos liceus (antigo 7.º ano, actual 12 º. ano) no Liceu Passos Manuel de Lisboa para ter acesso a estudos superiores do Instituto Nacional de Educação Física (actual Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa) que completei em 1956.
Dos meus tempos de aluno do Passos Manuel, recordo-me de dois acontecimentos que destaco:
- No 6.º ano, o meu professor de Educação Física era um médico baixinho e gordo que se colocava à porta do ginásio a chamar os alunos para as aulas que ministrava de chapéu na cabeça e sobretudo vestido. Invariavelmente, obtinha como resposta nossa: “Para ficarmos baixos e gordos como o professor não vale a pena fazemos ginástica!”
- No ano seguinte (sétimo e último ano do curso complementar dos liceus) tive como professor de Educação Física um adepto da ginástica respiratória (Método Dr. Weiss de Oliveira, chamado jocosamente de “ginástica de fole”) que nos mandava deitar de costas nos bancos suecos para, à sua voz de comando, inspirarmos e expirarmos. Acontece que um dia um contínuo o veio chamar para atender uma chamada urgente de telefone. Logo aproveitámos para dar vazão à nossa irrequietude juvenil pendurando-nos nos espaldares e correndo desenfreadamente pelo ginásio, com o cuidado de deixarmos a espreitar à porta um colega que nos avisasse da chegada do professor para nos deitarmos novamente nos bancos suecos em atitude inspiratória, posição em que ele nos tinha deixado antes da sua saída do ginásio. Passados muitos minutos, regressou o professor que olhando para nós, e vendo-nos de peito “inchado”, nos disse: “Podem expirar, meus senhores!”. Ou seja, desta forma, tornamo-nos recordistas de apneia voluntária!…
Serviço militar: Curso de Oficiais Milicianos da Escola Prática de Infantaria de Mafra (1952,) especialidade de atirador, tendo sido colocado em Tomar como aspirante e alferes no respectivo Regimento de Infantaria 12, onde tive como camarada o actual General Pezarat Correia (então aspirante a oficial do Quadro Permanente).
Percurso Profissional:
Para além de ter sido inspector Provincial de Educação Física da Mocidade Portuguesa, a minha actividade docente, em Lourenço Marques, decorreu, essencialmente, na “nossa” Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque e, no decurso apenas de um ano lectivo (1974), na Escola Comercial Dr. Azevedo e Silva. Depois da Independência fui colocado no liceu D. João III em Coimbra, tendo sido, também, docente do ISEF da Universidade do Porto. Em Coimbra fui ainda professor da Escola do Magistério Primário e, posteriormente, da Faculdade de Educação e Ciências do Desporto da Universidade das margens do Mondego. Relevo, ainda, a minha actividade no campo da Reabilitação Física, em Lourenço Marques, com doentes locais e outros enviados pelo Dr. David Roux, reputadíssimo médico ortopedista sul-africano, e continuada em Coimbra. Fui, para além disso, professor de Reabilitação do ISEF da Universidade do Porto, por concurso público. Do meu percurso profissional, evoco a preparação física de diversas modalidades desportivas (natação, basquete, futebol, etc.) e cargos no dirigismo desportivo moçambicano, por exemplo, vice-presidente da Comissão Administrativa da Associação Provincial de Natação de Moçambique. Vice-presidente da Comissão Administrativa da Associação Distrital de Voleibol de Lourenço Marques, presidente da Comissão Administrativa da Associação Provincial de Halterofilismo de Moçambique.
Rui Baptista aos vinte e tal anos de idade…
Percurso desportivo:
Aonde e quando iniciaste a tua actividade desportiva? Para além de esporádicas participações em competições universitárias de Futebol, o meu modesto percurso gimnodesportivo, teve início como ginasta de uma classe especial (1947) do Ginásio Clube de Portugal. No ano seguinte, dirigi-me à Secção de Halterofilia, desse clube, de que era treinador o senhor Ernesto Sales. Como fosse bastante franzino, a primeira reacção desse treinador foi: “Vai para casa, come muita sopinha, e depois aparece!”
A insistência minha, cedeu em dar-me para as mãos uma barra de poucos quilos de peso para que eu a levantasse acima da cabeça (levantamento olímpico de “press”) , que executei com toda a facilidade. Pedi, então, para recarregar a barra com o equivalente ao meu peso corporal, tendo executado essa tentativa. Espantado, voltou-se o treinador Ernesto Sales paras os atletas por si treinados ( de entre eles um campeão nacional), dizendo-lhes: “Vejam só este “lingrinhas”, a fazer aquilo que alguns de vocês se espremem para o fazer…e nem sempre conseguem! “A partir daí, dediquei-me ao Culturismo de que me viria tornar campeão de Lourenço Marques, na categoria de Médios, em representação do Clube Ferroviário de Moçambique (1963).
Qual foi a tua principal modalidade? Halterofilismo/Culturismo.
Em Moçambique, na Costa do Sol, na companhia das duas filhas mais velhas (fins da década de 67)
Recorda alguns dos momentos mais marcantes e o mais frustrante na tua carreira desportiva:
O momento mais marcante da minha vida desportiva foi ter tido a coragem de ministrar preparação física (com pesos e halteres que “prendiam os músculos” e faziam “mal ao coração”) aos nadadores moçambicanos que bateram vários recordes nos Campeonatos Nacionais de Natação/1958, levados a efeito em Portugal metropolitano (piscinas de Algés e Dafundo, Figueira da Foz, Luso, etc.). E por ter tido a honra de ser chefe da respectivas embaixada, em representação do Conselho Provincial de Educação Física de Moçambique.
A situação mais frustrante da minha vida desportiva, aqui a relato. No ano em que me sagrei campeão, na classe de médios, em representação do Ferroviário (com o peso corporal de 75 quilos e a marca de 122,310 quilos), o atleta do Ginásio, Leong Siu Pun (com o peso corporal de 83,200 quilos e a marca de 131,370 quilos) ficou classificado em 2.º lugar na categoria de pesados. Categoria que viria a ser ganha por José Coelho, do Ferroviário, com o peso corporal de 90 quilos e a marca de 134,088 quilos. Torna-se importante relevar o facto de à época estes levantamentos se ficarem a dever a um treino intensivo sem a complementação de esteróides anabolizantes, como o sucedido hoje em que os resultados dos levantamentos se ficam a dever em 10% ao treino e em 90 % a ajudas químicas. No ano seguinte, num novo campeonato, aquando da pesagem dos atletas, o atleta Leong encontrava-se, agora, na categoria de médios (peso corporal até 82,5 quilos) . Perante o meu espanto, com um sorriso trocista nos lábios, sujeitou-se a nova pesagem que o colocou na categoria de médios que venceu, tendo eu ficado em 2.º lugar!…
Quais os clubes que representaste? Clube Ferroviário de Moçambique e Ginásio Clube de Portugal.
Os teus ídolos na tua modalidade de eleição? Steve Reeves, Mister Mundo e Mister Universo, actor de filmes épicos.
O escultural culturista e conhecido actor de cinema Steve Reeves, “Mr. America” (1947), “Mr. World” (1948) e “Mr. Universe” (1950), que inspirou para a prática do Culturismo jovens do mundo inteiro, como Arnold Schwarzenegger, 7 vezes “Mr. Olympia”, actor de cinema e ex-governador da Califórnia.
Outras modalidades que tenhas praticado? Futebol Universitário.
A modalidade que mais aprecias na qualidade de tele/espectador? Futebol.
O teu clube do coração:
Em Moçambique: Clube Ferroviário de Moçambique (em 1.º lugar).
Em Portugal: Sporting Clube de Portugal.
Ídolos de outras modalidades:
Natação – Regina Veloso.
Basquetebol – Paulo Carvalho.
Futebol – Nené (futebolista do Desportivo de Lourenço Marque e da Académica de Coimbra, já falecido).
Qual o teu hobby? Escrita de livros, artigos de jornais e blogues (“De rerum natura” e “BigSlam”).
Destino de férias preferido? Em Moçambique, Xai-Xai;
Em Portugal, Figueira da Foz, “Praia da Claridade” em que o seu areal imenso me fazem recordar as paradisíacas praias do Índico.
No belíssimo areal da Figueira da Foz com o neto Rui Afonso (1995)
Viagem de sonho que gostarias de realizar ou que já realizaste? Moçambique.
Uma cidade para viveres? Coimbra.
O teu canal de TV? SIC.
Programas televisivos do teu agrado? Telejornal, filmes, mesas-redondas, desportivos.
A tua estação de rádio? RFM.
Um dos teus filmes preferidos? “Casablanca”.
Qual o teu actor/actriz predilecto? Ingrid Bergman e Al Pacino.
Uma das tuas músicas favoritas de sempre? “My way” (Frank Sinatra).
O teu cançonetista ou banda favorita de sempre? Beatles.
Escritor preferido: Eça de Queiroz.
O teu prato predilecto? caril de camarão.
Elege um animal de estimação: cão.
A tua cor preferida? Azul.
As tuas qualidades: Endosso a resposta para os meus cinco antigos alunos da EIMA que me deram a honra de um almoço de homenagem em Coimbra, deslocando-se de cidades distantes desta urbe e tantos outros que me têm desvanecido com comentários a textos meus neste site.
O homenageado com os alunos Godinho Antunes, Carlos Conceição, Carlos Silva (não aparece na fotografia o respectivo fotógrafo, Adolfo Figueiredo)
Os teus defeitos: Antes quebrar do que torcer (mas será um defeito?).
Acontecimento pessoal que mais te marcou? O acontecimento que mais me marcou foi o nascimento dos meus 6 filhos “coca-colas”. Num país de pesadelos constantes, não me atrevo a sonhar por estar nada optimista quanto ao futuro de Portugal, um país que teimosamente mantém no governo o ministro Miguel Relvas. Por isso os meus olhos dão conta da minha descrença.
Citações favoritas:
- “Fazei primeiro o vosso filho são e forte para que possais vê-lo inteligente e sábio” –(Jean-Jaques Rousseau);
- “A nossa fatalidade é a nossa história” – (Antero de Quental).
Dá a tua opinião sobre o www.BigSlam.pt
Tem a suportá-la, para além de outros e bem merecidos encómios, o facto de se ter tornado num “Ponto de Encontro” de quem viveu a felicidade, como praticante ou simples espectador desportivo, de ter estado em Moçambique e vive, hoje, a saudade das sua paisagens idílicas e da sua gente negra de alma branca.
Deixa aqui a tua mensagem para os leitores do BigSlam:
É de profunda gratidão para com Samuel Carvalho e os simpáticos comentários que têm feito a textos meus, publicados neste site: “kanimambo”!
O BigSlam agradece ao Prof. Rui Baptista toda a sua disponibilidade e simpatia em responder a esta entrevista.