Macau, Portugal e Moçambique: Um Legado Lusófono (2) – “Macau e Malaca”
Por Manuel Silva
2. Macau e Malaca
2.1 Fortaleza de Malaca
A Fortaleza de Malaca localizava-se na cidade de Malaca, na Malásia. A estrutura que em nossos dias é denominada como – “A Famosa” foi em tempos a Porta de Santiago. Esta era uma das antigas portas que se rasgavam na muralha da cidade, defendida pelo baluarte de mesmo nome, voltado para o mar, que ali chegava à época.
Em sua origem, “A Famosa” era o epíteto da primitiva torre, erguida por Afonso de Albuquerque quando da conquista da cidade em 1511, mas que foi severamente danificada quando do cerco de 1640-1641, e que culminou com a conquista da cidade pelos holandeses. Por intervenção oportuna de Thomas Stamford Raffles, fundador de Singapura e grande apaixonado pela história, que visitou Malaca em 1810, esta pequena porta foi poupada da destruição.
2.2 O sagrado canhão português
Talvez a mais célebre peça portuguesa do Oriente seja o Si Jagur, ou Senhor da Fertilidade, hoje património nacional da Indonésia e que se encontra no Museu Nacional de Jakarta, que foi tomado aos portugueses em 1641, na conquista de Malaca pelos holandeses.
Esta boca-de-fogo é atribuída a Manuel Tavares Bocarro (1625-1652) mestre da Fundição de Macau.
Comparando-o com os exemplares do Museu Militar de Lisboa e do Miracle cannon, da África do Sul, a semelhança da decoração do Si Jagur quer no remate em figa, quer nos dragões que servem de asas, etc., indiciam o mesmo fundidor – Manuel Tavares Bocarro. Filho de Pedro Dias Bocarro, mestre das Fundições de Goa, que deve ter chegado a Macau em 1625, tendo sido o mais célebre fundidor do Oriente até 1652, fundindo inúmeras bocas-de-fogo, sinos e estátuas. Já em 1635, em Goa, o cronista António Bocarro (1594-1652), falando de Macau, escrevia: “Este lugar possui uma das melhores fundições de canhões no mundo, quer de bronze, que já tem há muito ou de ferro, que foi feita por ordem do Vice-rei, Conde de Linhares (D. Miguel de Noronha, 4º conde 23º vice-rei, 1585-1647), e onde é fundida continuamente artilharia para todo o seu Estado (da India), a preço muito razoável”. Duas das suas bocas-de-fogo encontram-se na Torre de Londres, outras duas, provenientes do galeão Santíssimo Sacramento e do Nossa Senhora da Atalaia do Pinheiro, foram declaradas património nacional da África do Sul em 7 de março de 1986, etc.

O Canhão Sagrado Si Jagur (Senhor da Fertilidade), português – Foto tirada em 2.2.2015
- O Canhão Sagrado português, Si Jagur de bronze, 384 cm.; cal. 39 cm.; peso: 3500 kgs, possui a seguinte inscrição: EX ME IPSA RENATA SUM, o que significa “Eu renasci de mim próprio” ou “Eu voltei a nascer a partir de mim próprio” que dá a entender que houve um primeiro canhão que, inutilizado por qualquer razão, foi tornado a fundir num segundo canhão. Para o azar não se repetir e para, desta vez, ter melhor sorte, fizeram-lhe uma figa.
É proveniente de Malaca, que foi tomada aos portugueses em 1641, e foi fundido em 1640, pelo mestre da Fundição de Macau, Manuel Tavares Bocarro (1625-1652). Encontra-se no Museu Nacional da Indonésia, Fatahillah Square, Jakarta em Jakarta, Indonésia
2.3 S. Francisco Xavier – 1552
Introdução: O Castelo de Xavier (em castelhano: Castillo de Javier) localiza-se no termo do município de Xavier, na província e comunidade foral (comunidade autónoma) de Navarra, na Espanha.
Ergue-se em uma elevação em posição dominante sobre a vila, cerca de 52 quilómetros a leste da capital, Pamplona. O nome de Xavier provém do dialeto basco etxebarri (“casa nova”) de onde derivou “xabier” e posteriormente, “javier” em castelhano.
Neste castelo nasceu e viveu São Francisco Xavier, filho dos senhores Javier, de onde tomou o seu apelido. Por essa razão, é o destino de uma concorrida peregrinação anual, em inícios de março, em homenagem do santo padroeiro de Navarra, chamada popularmente de “Javierada”.
2.4 A ilha de Sanchoão é conhecida como o local da morte de São Francisco Xavier
Sanchoão ou Sanchuão ou ainda São João (em pinyin: Shàngchuāndǎo; Sancian ou Chang-Chuang) é uma ilha situada no sul da Província de Guangdong, na China (longitude leste 112º47′; latitude norte 21º 39′). Com a área total de 137 km2, é a maior ilha da província. Tem uma extensão de costa de 139,87 km e praias de 30 km de comprimento. A população é de 16.320 habitantes.

A ilha de Sanchoão – Shangchuan Island
A ilha de Sanchoão é conhecida como o local da morte de São Francisco Xavier. No século XVI, foi uma das primeiras bases insulares estabelecidas pelos portugueses na China. O local foi abandonado após a ocupação de Macau, em 1557.
O missionário jesuíta navarro Francisco Xavier, adoeceu a caminho de Guangzhou (Cantão) e veio a falecer em Sanchoão, a 2 de dezembro de 1552, antes de alcançar o continente. Há um parque em memória do santo – o primeiro missionário católico no Extremo Oriente. Dentro do parque há uma igreja a ele dedicada, além de um cenotáfio e uma estátua. É local de peregrinação de católicos.

São Francisco Xavier. Retrato japonês do período Nanban.
São Francisco Xavier, nasceu em Xavier-Navarra (Espanha) em 7 de abril de 1506. Faleceu em Sanchoão (China) no dia 3 de dezembro de 1552. Foi um missionário católico do padroado português e apóstolo navarro. Pioneiro e cofundador da Companhia de Jesus. A Igreja Católica Romana considera que tenha convertido mais pessoas ao Cristianismo do que qualquer outro missionário desde São Paulo, merecendo o epíteto de “Apóstolo do Oriente”. Ele exerceu a sua atividade missionária no Oriente, especialmente na Índia Portuguesa e no Japão. É o padroeiro dos missionários, também um dos padroeiros da Diocese de Macau e e co-patrono de Navarra juntamente com São Firmino de Amiens.
Foi beatificado, com o nome Francisco de Xavier pelo Papa Paulo V a 25 de outubro de 1619 e canonizado pelo Papa Gregório XV, a 12 de março de 1622, em simultâneo com Inácio de Loyola. Em 14 de dezembro de 1927 o Papa Pio XI proclamou Francisco Xavier, juntamente com Santa Teresinha do Menino Jesus, padroeiro universal das missões. O seu dia festivo é 3 de dezembro. Portanto, S. Francisco Xavier morreu a 3 de dezembro de 1552, numa humilde esteira de vimes, abraçado ao crucifixo que o velho amigo Inácio de Loyola, um dia, lhe tinha oferecido.
Foi primeiramente sepultado em Sanchoão, mas, em fevereiro de 1553, os seus restos mortais, encontrados incorruptos, foram transportados da ilha e, temporariamente, sepultados na Igreja de São Paulo em Malaca. Uma campa aberta na igreja mostra ainda hoje o lugar onde São Francisco Xavier esteve sepultado.

Fotografia do interior da Igreja de São Paulo, em Malaca, onde S. Francisco Xavier esteve temporariamente sepultado.

O autor deixando-se fotografar em frente da estátua de S. Francisco Xavier junto à Igreja de São Paulo, em Malaca.

O autor junto à Fortaleza de Malaca, na Malásia. A estrutura que em nossos dias é denominada como “A Famosa” e foi em tempos a Porta de Santiago.
Depois de 15 de abril de 1553, Diogo Pereira vem de Goa, remove o corpo de Xavier e, a 11 de dezembro desse ano, o corpo de Xavier é levado para Goa. O seu corpo está hoje na Basílica do Bom Jesus de Goa, onde foi colocado numa caixa de vidro e prata, a 2 de dezembro de 1637, e se tornou lugar de peregrinação.

O corpo de São Francisco Xavier na Basílica do Bom Jesus de Goa, colocado numa caixa de vidro e prata.
Um osso do úmero direito de Xavier foi levado para Macau, onde é mantido num relicário de prata. Esta relíquia destinava-se ao Japão, mas a perseguição religiosa na região levou a que fosse mantida na Igreja da Madre de Deus em Macau, cujas ruínas são atualmente conhecidas como Ruínas de São Paulo.

Igreja de São José, em Macau
Hoje em dia, é na Igreja de São José, em Macau, que está depositada essa relíquia sagrada de São Francisco Xavier.
Muitas igrejas foram desde então erguidas em honra de Xavier, muitas delas fundadas por jesuítas. Um parente seu, João de Azpilcueta Navarro, foi um famoso missionário jesuíta no Brasil. São Francisco Xavier figura no Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa.

Os restos mortais de São Francisco Xavier exposto em Goa em 2014. Foi a décima sétima vez que o corpo do Santo foi exibido.
Musica: “O comboio” da Tuna Macaense
- Não perca o próximo legado Lusófono (3): Macau e Moçambique
6 Comentários
Alfredo da Silva Correia
Ótima descrição do nosso passado. Ao seu autor os meus agradecimentos. Numa das viagens que fiz ao oriente, depois de ter passado por Macau e Hong Kong passei também por Malaca e nunca me esquecerei da forma como fui recebido numa sua rua, quando alguns habitantes se aperceberam que eu era português. Para eles eu seria alguém importante que tinha a ver com o seu passado já longínquo. Não me recordo o nome da rua mas a expressão das pessoas por estar ali um português nunca a esquecerei. De facto, nós os portugueses, temos uma história ainda que já longínquo que muito nos deveria orgulhar. Por isso li com muita atenção e interesse o descritivo com que nos brindaram. Obrigado
josé carlos alves da silva
Tínhamos tanta coisa, tudo nos roubaram
Luísa paixão
Muito obrigada obrigada amigo
Gostei muito de ler
Nunca sabemos de mais
Beijinhos
2luisbatalau@gmail.com
GRATO PELA INFORMAÇÃO E PELA REPORTAGEM. VALE A PENA LEMBRAR E RECORDAR.
ABRAÇO
LUIS BATALAU
Samuel Carvalho
Ler este artigo foi como abrir uma janela para memórias e histórias que fazem parte de nós. “Macau e Malaca” não são apenas lugares distantes, são capítulos vivos do nosso passado comum, que unem Portugal, Moçambique e o Oriente num legado que continua a pulsar no coração de quem o viveu ou herdou.
BigSlam
Mais um excelente artigo que resgata com sensibilidade os laços históricos entre Macau, Portugal e Moçambique. “Macau e Malaca” – dois portos, dois mundos, unidos por um legado comum que importa preservar e recordar.