“In Memoriam” de Nene, Jogador de Futebol da Associação Académica de Coimbra.
Nene na esquina da J. Serrão com a Augusto Castilho…
“As memórias procriam como se fossem pessoas vivas”.
Agustina Bessa- Luís.
Por pertença aos mortais que o fim de vida não pode fazer cair no esquecimento público, trago à presença do leitor a memória do talentoso Nene, jogador de futebol do Grupo Desportivo de Lourenço Marques e da Associação Académica de Coimbra.E se me é permitido, recordo-o, em memória pessoal, como aluno da Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque de Lourenço Marques em que, como a sua alegria de predestinado do desporto-rei, deliciava todos aqueles que tinham o prazer de ver passear este jovem estudante a sua enorme classe pelo recinto desportivo anexo.
A mim com o orgulho de ser seu professor de Educação Física e aos seus colegas, decerto, não com menor orgulho e encantamento, deleitados com as fintas de toureiro habilidoso nos jogos de futebol de 5 inter-turmas, realizados no velhinho campo poli-desportivo descoberto de uma saudosa escola que formou homens de rija têmpera, profissionais de incontestável valor e desportistas de grande mérito, v.g., Fernando Adrião, no Hóquei em Patins internacional, e Paulo Carvalho, no Basquetebol nacional.
Paulo Carvalho e Nene, dois atletas do Desportivo de LM, e estudantes na Escola Industrial Mouzinho Albuquerque (EIMA), na década de 60.
Passados escassos dias do infaustoso falecimento de Nene, cumpridos que estavam apenas duas dezenas de anos de idade, lia-se em “A Bola” (12/09/1971), em transcrição parcial que faço:
“Nascera em Madrid, mas cedo a família partiu de Moçambique. À aventura. Foi lá que despontou para o futebol no Desportivo de Lourenço Marques um rapazinho de seu nome Modesto Luís Ortiz de Sousa Neves – (Nene) era o seu nome de guerra/alcunha no jogo de pontapeio da bola. Com 17 anos ruma a Coimbra. Matriculado no Instituto Industrial, tornou-se atleta-estudante da Académica de Coimbra e seu jogador cobiçado. Aos 20 anos, o Sporting acena-lhe com um contrato milionário: 1.350 contos.
Era o preço do seu génio, da sua imaginação cintilante, dos seus dribles irresistíveis, das suas arrancadas destruidoras, dos seus remates fulminantes. Mas numa noite tepidamente trágica naquele Agosto, depois de ter jantado em Coimbra, pegou no seu Austin oferecido pela Académica e partiu para a Figueira da Foz, nesse percurso numa curva traiçoeira perdeu o controlo do carro e foi enfaixar-se nas traseiras de uma camioneta…
E Coimbra em dor e lágrimas. Pela morte de um ídolo ainda menino. E de um símbolo. Que era umas das maiores esperanças (se não a maior) do futebol Português. Jazia já no cemitério da Conchada em Coimbra”.
Frase final que eu me atreveria complementar com respaldo em Fernando Pessoa: “Jazia já no cemitério da Conchada, ‘o menino de sua mãe”.
Também jovem, muito jovem, a caminho da consagração no firmamento de Hollyood, morreu, igualmente, em desastre de automóvel no Porsche que conduzia (1955), James Dean, ícone da juventude rebelde da década de 50, como se o destino se comprazesse em ceifar a vida da sua melhor e mais promissora juventude. Também se tratava de um menino de que o mecânico que o acompanhava na ambulância ouviu “um grito suave emitido por Jimmy – a lamúria de um menino chamando sua mãe ou de um homem encarando Deus”.
Em destaque merecido, é recordado, em vésperas de nova participação da Académica na “Liga Europeia”, pelo médico de Coimbra Vitor Campos, seu companheiro de equipa, em jogo da 2ª mão (1970) , entre o Manchester City (que viria a conquistar a “Taça das Taças”desse ano) e a “Briosa”, em clima épico em que esta seria vencida no campo adversário por 0-1, depois de um empate a zero em Coimbra, a pessoa de Nene, num artigo do” Diário de Coimbra” (18/09/2012).
Equipa da Académica de Coimbra que participou na “Taça das Taças” em 1970… (Nene é o terceiro na fila debaixo).
Nesse texto de jornal, relata-nos Vitor Campos o seguinte:
“’Ninguém nos conhecia em Inglaterra e eles, na 2.ª mão, pensavam que iam dar três ou quatro a zero’, recorda Vitor Campos, que assume com orgulho que a Académica fez ‘a vida negra’ ao Manchester City.
Tínhamos uma equipa com qualidade, muito experiente’ afirma o antigo centrocampista que, apesar da derrota no prolongamento, não deixou de elogiar a grande jornada protagonizada pelos estudantes.
Sem querer tirar o mérito ao colectivo, o médico fez questão de elogiar um companheiro em particular: ‘Não posso deixar de destacar o saudoso Nene, que era um jogador fantástico. Pôs em sentido toda a defesa com uma excelente exibição individual que nos ajudou muito’”.
Quanto à equipa de Coimbra dos dias de hoje, Vitor Campos entende que ‘tudo pode acontecer na participação na Liga Europeia que começou na quinta-feira”. Um bem haja ao médico Vitor Campos pela recordação do saudoso Nene e pela oportunidade que nos deu de a ela nos podermos associar. E que melhor sítio para o fazermos com o auxílio precioso de comentários a este texto do “Bigslam”, ponto de encontro dos desportistas de um Moçambique sempre presente na nossa imensa e agridoce saudade.
Nene na praia da Polana, na companhia da sua cunhada Maria José e dos sobrinhos Carla e “Pitocas”.
3 Comentários
José Chaves
lembro-me do saudoso Nene, grande jogador. Ontem vi o programa da Sport Tv e vi alguns antigos jogadores da Académica a falar da final da taça de Portugal de 1969 entre a Académica e o Benfica. Que Deus o tenha no Seu reino.
Rui Baptista
Caro Pedro Lidington: Só depois de ter publicado o meu comentário a pedir testemunhos de antigos colegas de equipa equipa no GDLM de Nene, me deparei com este seu comentário. Seria possível publicá-lo no bigs Cumprimentos amistosos. Rui Baptista
Pedro Lidington
Foi com grande alegria que li tudo o que dizem deste meu grande amigo e companheiro.
Partilhei com ele no juniores do Desportivo grandes alegrias e jamais o esquecerei pelo belíssimo jogador que era e pela sua simpatia.
Bem hajam e um forte abraço onde ele estiver.