FIGURAS MOÇAMBICANAS DO NOSSO TEMPO – Romão Félix, o “Parafuso”
Hawena, famba à kuíne? – Mina! Famba Xilunguíne 1”
Romão Félix, depois de tantos momentos de alegria e boa disposição que nos proporcionaste, de maneira nenhuma me ia esquecer de ti!
Deixa-me dizer-te que não foste o único!
Porque também gostei e gosto de ver e ouvir, entre outros, estes humoristas e imitadores:
– O Raúl Solnado falecido a 8 de Agosto de 2009, que ainda hoje é reconhecido como um dos maiores nomes do humor português.
Começou no teatro em 1947, passou para a rádio, teatro de revista, televisão e cinema em 1956.
- O Nicolau Breyner – Um actor e realizador de cinema, que apresentou na televisão imitações de várias personagens nos seus programas de humor em: “O Senhor Feliz e o Senhor Contente” e “Eu show Nico” . Faleceu a 14 de Março de 2016.
- O Herman José – Um actor humorista de origem alemã que faz carreira em Portugal!
– Foi “descoberto” pelo Nicolau Breyner com quem contracenou na televisão imediatamente a seguir ao 25Abr74, na rábula o “Senhor Feliz e o Senhor Contente”.
- O Fernando Pereira – Um actor/cantor imitador com uma carreira internacional. Conhecido pela sua facilidade em imitar as vozes dos mais variados cantores. Sejam nacionais ou estrangeiros, homens ou mulheres!
- E mais recentemente o Ricardo Araújo Pereira – Começou com um grupo de humoristas denominados “O Gato Fedorento” com programas na rádio e televisão. O Ricardo, teve até há pouco tempo, um program de humor, “Gente que não sabe estar”, apresentado na TVI.
Mas Romão Félix, pela relação de proximidade que na minha juventude tinha contigo, ambos estávamos em L. Marques, tenho de te agradecer a alegria que me deste com as imitações que fazias do teu “Parafuso”. Que ficou célebre entre nós, com a frase:
… cada um és como cada qual, mas ninguém és como evidentemente…”
O “Parafuso”!
“Nasceu” em 1955 no Rádio Clube de Moçambique pela voz e imitações que o Romão Félix fazia do vocabulário da língua portuguesa utilizado pelos negros do sul de Moçambique ao falarem Português.
Ele imitava o “mainato, o cozinheiro, o criado, o empregado de mesa e…outros!”
O seu público alvo eram os naturais e residentes moçambicanos, e muitos portugueses radicados na África do Sul.
Em Lisboa o governo sempre teve um certo alheamento das políticas culturais, artísticas, musicais e dos usos e costumes das suas colónias de África. Por isso o Parafuso, e outros criativos das colónias, eram aqui pouco divulgados.
Refiro isto porque em diálogo, com amigos na mesa do café, sobre o programa “O Gato Fedorento” com o humorista Ricardo Araújo Pereira, a conversa desviou-se para o Solnado e o Herman. Ocorreu-me também, referir o Parafuso. Notei que não o conheciam, ou conheciam mal e “de ouvir falar!” Aproveitei para os informar do seu humor e imitações.
Um dos presentes perguntou-me se os moçambicanos não “levavam a mal” essas imitações.
Disse-lhe que só podiam levar a mal se fossem feitas de “má fé”. E que o youtube tem muitos vídeos, onde portugueses imitam brasileiros, alentejanos, madeirenses, açoreanos e outros! … Brasileiros imitam portugueses, africanos e espanhóis! …Espanhóis imitam venezuelanos e argentinos! – Perguntei-lhe “quem é que ali podia levar a mal!”
Disse-lhe também, que era/é minha opinião, que o humor e as imitações feitas em público, não são feitas com a intenção de menosprezar, escarnecer ou desconsiderar alguém. Mas sim, pela sã convivência existente entre todos. E é por isto que ainda hoje há portugueses e moçambicanos do sul, que acham graça e gostam de ouvir as gravações do Parafuso.
Creio que situações como estas só acontecem, porque quando se fala do humor africano, uns acham que quem o faz, só o faz com o intuito de os menorizar e humilhar. Outros há, que gostam de dizer “piadas e ditos”! Um desses “ditos” até foi determinante para que o BigSlam tivesse publicado, o meu post com o título: – “Estiveram em África a enriquecer às nossas custas”.
O texto que a seguir vos apresento faz parte do post que foi dedicado ao Parafuso, aqui no BigSlam, no dia 20 de Janeiro de 2013, aquando da comemoração das suas 77 risonhas primaveras. Hoje conta 83! E, pelo que sei, deixou de usar o seu bigode, tipo “lápis fininho”, sempre bem cuidado com que era visto na antiga L. Marques.
A história inédita do Grande Parafuso contada pelo seu pelo próprio punho!
“Manuel Romão Félix, nascido em Lisboa no dia 20 de Janeiro de 1936, casado com a minha Josefina. – Manuela Félix desde 1961.
Fui para Moçambique, Lourenço Marques em 1943, onde estive até 1976, ano em que tive de regressar a Lisboa pelos motivos que são do conhecimento de todos.
Não posso dizer que foi difícil a minha adaptação a Lisboa, embora como todos os “retornados”, tenha passado as passas do Algarve como se costuma dizer.
Voltando ao “meu Moçambique” ali passei os meus melhores anos da minha vida, andei na Escola Paiva Manso onde fiz a minha primária, frequentei durante algum tempo a escola especial, onde o director era o Malveiro, depois fui para a escola comercial onde fiquei só até ao 3º ano…
Aos 15 anos comecei a trabalhar num despachante oficial (Hélder Barata) estive por lá dois anos e tal e o meu vencimento na altura eram uns 500 escudos, depois passei para uma firma de transitários “Fred Cohen Goldnan” e já lá trabalhava o Bebé Carreira que já ganhava umas massitas.
Em 1955, o Rádio Clube de Moçambique, fez um concurso para cançonetistas, instrumentistas, e imitadores, classe em que eu concorri.
Fiquei em 1º lugar imitando um negro na sua maneira típica de falar o Português e assim nasceu “O Parafuso”.
Dali para a frente, felizmente o sucesso foi grande, fui então convidado pelo RCM, e passei a fazer parte do seu Cast Artístico, participando nos famosos programas de variedades ás terças e sextas feiras. Depois, passei a fazer espectáculos em todas as grande e famosas salas de Lourenço Marques, percorri todo o Moçambique, fiz muitos espectáculos na África do Sul, (Johannesburg, Pretória, Durban, Cape Town).
Em Moçambique, gravei 18 discos, o maior numero até á data, e todos eles atingiram RECORD DE VENDAS…
Durante a minha fase artística, trabalhei na Delta Publicidade que era dos meus amigos Carlos Albuquerque e Graça.
O Albuquerque ali fazia diverso serviço publicitário, e tinha também, para além dum programa do Parafuso, colaboração em locução noutros programas.
Em 1955 fui para Boane cumprir serviço militar e ali conheci a minha mulher Manuela, o grande suporte da minha vida, e este ano (2010) fazemos já 55 anos de casados…
Em Lisboa o Parafuso, também teve um sucesso enorme, gravei dois discos single, sendo o 1º “Parafuso em Lisboa” o disco mais vendido em Portugal, foram qualquer coisa como 60.000 exemplares, na época era muito disco…
depois fiz ainda um espectáculo na TV e diversas actuações pelo País…
Em 1984 o “Parafuso” arrumou as botas, mas não quer dizer que de vez em quando não faça umas gracinhas, nem que seja para os netos…
Naturalmente a minha vida artística foi muito completa e muito ficou por dizer, mas por estas linhas, certamente que muitos ficarão a saber um pouco da vida do PARAFUSO.
* A si arguém ficaste chatiado com este mensagem do Parafuso, descurpa…
Sim…chi…mas cada um és como cada qual, mas ninguém és como evidentemente …Hambanine e qui o chicuembo proteja todos vocês…
Hambanine tátá!
Para terminar um momento único na voz do “Parafuso” – Tantas Saudades…!”
Algumas imagens feitas pelo BigSlam a 13 de Março de 2010, na abertura da exposição sobre a vida e a obra de Romão Félix “Parafuso”, na sede da ACRENAMO em Leiria.
Dois excelentes artistas “moçambicanos” – Romão Félix e João Maria Tudela (entretanto falecido).
Caro Romão, ainda pensei em falar contigo antes de publicar este post. Mas decidi fazer-te a surpresa!
Mas: – “ Si argúem ficaste chatiado com este mensagem do “Xilunguíne”, descurpa sim…”
Kanimambo “Parafuso”. Desejamos-te, assim como à tua “Josefina” Manuela, muitas felicidades e anos de vida.
(1) – “É pá, onde vais? – Eu! vou ao sítio dos brancos (Lourenço Marques)”- Diálogo em dialecto Xangana ouvido frequentemente entre dois moçambicanos do sul do País.
– A próxima “Figura moçambicana do nosso tempo” é o Malangatana Valente.
Para nós, com o BigSlam, o mundo já é pequeno. Muito pequeno!
João Santos Costa – Novembro de 2019
5 Comentários
MANUEL ROMÃO FÉLIX
Obrigado amigos obrigado amigas,do fundo do coração vos agradeço palavras tão bonitas que me são dirigidas,não sei se serei merecedor de tantas demonstrações de amizade e porque não dizer de amor de qualquer modo KANIMAMBO,aproveito para desejar um NATAL muito feliz na companhia dos vossos queridos e principalmente com saúde. Embora já com 83,felizmente vou bem de saúde embora com alguma ferrugem.Vivo em Tavira e gosto muito,da cidade e das pessoas,mas nada me faz esquecer o nosso MOÇAMBIQUE o nosso LOURENÇO MARQUES.
HAMBANINI amigos TÁTÁ.❤❤❤❤❤🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩🔩
Andrelise
Senhor Romão Félix. Qual é o seu contato de e-mail? Gostaria muito de fazer uma entrevista com o senhor.
Manuela Queirós
Ainda há poucos anos o ouvi numa festa em Portimão de 50 Anos de casamento de uns grandes amigos nossos, já falecidos sr.Coelho e Dª.Maria e adorei ouvi-lo,muito obrigado por este trabalho.
António Amorim Lopes
MUITO OBRIGADO AO “PARAFUSO”, A JOÃO SANTOS COSTA E A TODAS AS PESSOAS QUE NOS MITIGAM AS GRANDES SAUDADES QUE TEMOS DA EXTRAORDINÁRIA E LINDA TERRA DE MOÇAMBIQUE E DAS BOAS GENTES COM QUE LIDEI DURANTE TANTOS ANOS.
Ernesto Silva
Obrigado João Santos Costa por mais este belo trabalho da nossa lendária figura “O PARAFUSO”. o grande Romão Félix que tanto nos fez rir com as suas brincadeiras radiofónicas. Sei que ele ainda vai fazendo umas brincadeiras entre amigos, no entanto os seus registos jamais se apagarão e continuaremos a rir, sempre que algum dos seus registos seja ouvido. Um obrigado a ti e ao Bigslam.