Eça de Queirós não morreu!
Se Eça de Queirós, um dos nomes maiores da literatura portuguesa, no interior do seu túmulo comentasse sobre o que via na cerimónia de transladação dos seus restos mortais para o Panteão Nacional,
ocorrida no mês passado, talvez dissesse o que segue:
“Ah, caros amigos, que cena memorável foi a transladação dos meus restos mortais para o tão augusto e marmóreo Panteão Nacional!
Um espetáculo de pompa e circunstância, onde as excelências, engravatadas como pavões em dia de gala, desfilavam com uma gravidade cómica, qual procissão de almas perdidas em busca do protagonismo perdido. Ali estavam os políticos do nosso amado Portugal, disputando entre si o melhor ângulo para a fotografia histórica. Ora, não lhes leveis a mal – o seu zelo não era por mim, pobre cadáver literário, mas pela luz do flash, essa que ilumina mais que o espírito da literatura. Uns com o semblante solene de quem nunca abriu um dos meus livros, outros com discursos decorados à última hora, mal contendo os risos ao citar “Os Maias”, obra que, presumo, pensavam ser sobre horticultura.
E os poderosos, esses senhores que governam com um misto de ignorância e convicção, lá estavam também, como se a minha transladação fosse, de repente, um triunfo da pátria. Falavam de valores e cultura, enquanto um deles, não identificado mas demasiado familiar, consultava apressadamente o telemóvel para verificar a popularidade do evento nas redes sociais.
Ah, e o povo, que maravilha! Algumas almas sinceras, outras apenas curiosas, vinham assistir ao espetáculo como quem vai ao circo – e com razão, pois o circo era grande. Vi rostos admirados a perguntar: “E quem era este Eça, afinal?” Não lhes culpo, pois os meus livros não são tão populares como a bola ou a telenovela, mas ainda assim, confesso, senti um ligeiro desconforto ao ouvir um petiz perguntar se eu era um novo treinador da seleção.
E lá me levaram, como uma espécie de troféu literário, para repousar ao lado dos grandes vultos da nação. Ah, se eles soubessem o quanto critiquei a vaidade, a hipocrisia e o formalismo, talvez tivessem pensado duas vezes antes de me colocar no meio de tão ilustres companhias. Mas, enfim, o Panteão é a última ironia da minha vida – ou da minha morte – e por isso aceito-a com o mesmo sorriso mordaz com que vos retratei a todos.
Que descansem bem, meus senhores. Eu, por cá, ficarei eternamente a observar-vos, do alto do mármore, com a mesma verve que me fez imortal.”
O comentário crítico de Eça de Queirós que acabaram de ler, foi a transcrição que faço (com a vénia devida) de um texto – cuja autoria desconheço, e que me foi enviado por pessoa amiga – do que diria o escritor, segundo uma simulação pelo ChatGPT.
Esta simulada crítica reflete perfeitamente a análise que o escritor faz nos seus livros à governação do País, ao comportamento dos partidos, dos seus políticos e da sociedade, no seu tempo (finais do século 19). Impressiona como a sua análise crítica se aplica que nem uma luva aos tempos de hoje, passados mais de um século.
Em Lourenço Marques, creio que no Teatro/Cinema Manuel Rodrigues, vi o filme “A men for all seasons”.
Aproprio-me do nome do filme para dizer que Eça de Queirós é Um Homem para a eternidade.
Há pessoas que pela singularidade da sua excelência perduram para além da morte – Eça de Queirós não morreu!
Pierre Vilbró – Fevereiro 2025
12 Comentários
Manuel Martins Terra
Caro Pierre, na verdade a perceção de extratos que nos falam autores portugueses do século XIX, não divergem quase em nada do que se passa nas sociedades modernas, incluindo o que avassala no nosso país, no que diz respeito à corrupção. Práticas corruptas, uma vez enraizadas, tendem a se perpetuarem no tempo. Por tudo isto, somos obrigados a concluir que se mudam os tempos, mas não se mudam os costumes. Hoje Eça de Queirós, se fosse vivo, diria precisamente o mesmo. Caro Pierre Vilbró, um abraço amigo do Manuel Terra.
Orlando Valente
Caro conterraneo Pierre Vilbro
Ja falamos sobre o o ECA DE QUEIROS e levado por curiosidade, li as suas habilitacoes literarias e fiquei satisfeitro porque por coincidencias tivemos a mesma actividade profissional. Nasci na Ilha de Mocambiquen em 1943, em Lourenco Marques tirei o curso de construtor civil diplomado e alguns anos depois, tirei o curso de Agente Tecnico de Arquitectura e Engenharia. Em fInais dee 1975, fui para a Africa do sul, onde residi por 40 anos. Inicialmente trabalhei na Companhia LTA CIVIL DESIGN onde permaneci 6 anos. Montei o meu gabinete TECNICO DE ARQUITECTURA, trabalhando por conta propria. Em 2015, por motivos de seguranca, vim para a IRLANDA, reformei-me e ja ca estou ha 9 anos. No meu passatempo faco POEMAS e atraves do BIGSLAM, sao publicados, o que muito me insentiva ….
Sobre o que o Pierre Vilbro mencionou no seu curriculum, em 1976 veio para Portugal e optou pela cidadania Portuguesa…aconteceu o mesmo comigo… NASCEMOS EM MOCAMBIQUE, PROVINCIA PORTUGUESA… CUMPRIMOS SERVICO MILITAR, DEFENDEMOS PORTUGAL… nao vou continuar com a historia que tem como a PERSONAGEM HISTORICA NA ALTURA, O COMUNISTA VASCO GONCALVES., primeiro ministro portugues.. quando me apresentei no Consulado Portugues em Johannesburg, nao me renovaram o passaporte portugues… porque era mocambicano… assim fiquei APATRIDA DURANTE 9 ANOS… muito muiito mais teria que contar… apenas foi um desabafo…
Caro conterraneo, continue a escrever, (nao se importe nos erros ortograficos) HA MUITOS PROFESSORES QUE NOS ENSINAM… O TEXTO NAO CONTA….
Um abraco e muuita saude, sao os meus votos.
Orlando Valente
Pierre Vilbró
Sr. Orlando Valente:
Cumprimento-o e agradeço o teor do seu comentário. Mais poderia eu acrescentar, mas vou só dizer o seguinte, que com a sua vivência (que eu concluo das suas palavras) certamente compreenderá: certas experiências de vida permitem-nos olhar o mundo e as pessoas de uma forma especial, e a certas pessoas levam-nas a compartilhar o que lhes vai na alma, seja em poesia ou em prosa, mesmo sem serem poetas ou escritores. Mas com autenticidade e seriedade. É o que se passa comigo. Deduzo que consigo também.
Fique com um cordial abraço.
Pierre
António Aves
Na ” cerimónia ” estavam lá todos os personagens que o Eça satirizou : os ” Gouvarinhos , o Dâmaso Salcede , o Palma Cavalão da Corneta do Diabo , etc. etc. Parabens Pierre Vibró pelo seu Texto ! Tambem sou laurentino , nado e criado em Lourenço Marques
Pierre Vilbró
Sr. Nelson Barata:
Cumprimento-o e agradeço as suas opiniões e a sua colaboração opinativa.
Permita-me que transcreva do Dicionário da Língua Portuguesa:
– transladação: trasladação; acto ou efeito de mudar.
– lhe: … a ele; a ela.
Pierre
Nino ughetto
formidavel
João Santos Costa
Muito bem! Possivelmente era mesmo isto que o EÇA diria.
E a parte final do artigo “Um homem para a eternidade” está muito bem recordada. O EÇA não morreu.
Eduardo Castro
Excelente!!!
josé carlos alves da silva
Tudo dito…. É bem dito. Grande poeta…. Numa grande época……
Nelson Barata
Notável texto se, concebido por simulação, em ChatGPT.
Isto provará que a IA quando utilizada a favor do Bem, pode ser muito útil.
Contudo, contém incorrecções em que o nosso grande Eça, jamais, caíria.
“Trasladação” e não “transladação” conforme menciona o texto.
“Não os culpo” ao invés de, “não lhes culpo” é talvez outra imprecisão, embora se possa utilizar.
As imagens dadas pelo texto são, como o próprio diria:
“Os políticos e as fraldas, devem ser mudadas amiúde e pelas mesmas razões”
Gosto bastante, das intervenções deste senhor Pierre Vilbró, em vários assuntos em que se manifesta.
Cumprimentos a todos
Dulce Gouveia
Os grandes Homens nunca morrem…….
Parabéns pelo texto Pierre!
Ruy FL Zibreira
Belo texto, que me leva a concluir (vale o que vale) que infelizmente Portugal nao evoluiu grande coisa…
EdQ viveu durante a Monarquia, tendo sido um grande critico (com as suas razoes) e, parece-me, grande apologista da republica. As “revoluçoes” de 28/05/1926 e 25/04/1974 pouco ou nada fizeram o Portugal actual muito melhor do que aquele em que viveu EdQ