ENCONTRO DOS EX-ALUNOS DO INSTITUTO INDUSTRIAL DE LOURENÇO MARQUES, NA CASA DO DIABO
- Introdução
Fazia tempo que evoluía em mim a vontade de escrever algo que lembrasse e enaltecesse os ex-alunos do Instituto Industrial de Lourenço Marques (IILM) e, consequentemente, esta grande escola de formação de técnicos qualificados na área da engenharia técnica, nos cursos de electrotecnia, máquinas/ mecânica, civil e minas.
A vontade ia-se acentuando com o passar do tempo, mas sem ideia quanto à sua forma e ao seu conteúdo, o que finalmente veio a manifestar-se no 41º. Encontro dos ex-alunos do IILM, realizado em 28/5/2016 num restaurante localizado numa quinta, nos arredores de Fátima.
Tudo resultou de uma sucessão de ideias interligadas: Fátima, templo de Nossa Senhora, devoção católica, casa de Deus; restaurante, mesa farta, gula, pecado, Diabo, casa do Diabo. Analogia com o percurso de vida destes ex-alunos que peregrinam uma vez por ano, há já quatro décadas, para se encontrarem (uns com os outros, consigo próprios e com o passado), foi imediata. Estava encontrada a inspiração. Faltava explorá-la e desenvolvê-la, o que foi feito em alguns meses – a vida de uma pessoa não dedicada à escrita, tem um ritmo não compatível com compromissos e prazos, mas tão só com o tempo disponível, a inspiração e o prazer de fazer.
Introduzo a figura do Diabo para significar o esforço e o sacrifício do curso académico, as rasteiras e as falsidades da vida profissional e, também, da vida em geral.
- Viagem para a Casa do Diabo
Fátima é terra de peregrinação, encaminhando-se os peregrinos para o seu Santuário, templo de Maria, mãe de Deus, movidos pela sua fé religiosa.
Mas nesse 28 de Maio de 2016, os peregrinos eram outros, o templo era outro, e outra a fé mobilizadora. Os peregrinos eram os ex-alunos do Instituto Industrial de Lourenço Marques, o templo de destino era a casa do Diabo, e a fé que os animava era o espírito de estudante e de camaradagem que neles permanecia e que alimentava a chama do reencontro anual com memórias de um tempo único e especial na vida de todos eles.
Esses peregrinos, todos “…entas” de idade, a grande maioria já avôs, vinham de todos os pontos de Portugal, um ou outro vindo até de Moçambique, Angola e Brasil.
Pacheco (nome fictício), vindo de Sul, deixou a autoestrada do Norte, A1, na saída para Fátima. Na 1ª. rotunda, ao invés de tomar a direcção da casa de Deus, o Santuário, virou à direita, no sentido Sul, com destino à casa do Diabo, o restaurante situado numa quinta. Nesse ano, esse o local escolhido para o encontro anual dos antigos alunos do IILM, sempre no último sábado de Maio. Realizava-se o 41º. Encontro, quatro décadas de confraternização.
Com bastante antecedência, como tem sido hábito todos os anos, recebeu Pacheco, na sua caixa de correio electrónico, o e-mail publicitando este encontro anual e fornecendo todas as informações: nome, morada e GPS do restaurante, hora, preço e menu.
Com o seu feitio metódico e organizado, Pacheco preparou previamente a sua viagem de cerca de 280 km (560 km, ida e volta). No Google Maps localizou o ponto de destino e tomou nota do trajecto a percorrer na região, precavendo-se assim de algum engano, perca de tempo e atraso. Em caso de necessidade, socorrer-se-ia de informações solicitadas localmente, recurso que muitas vezes utilizava. As coordenadas do local de destino não poderiam ser por si utilizadas porque o seu automóvel não dispunha de GPS.
Apesar de toda esta precaução prévia, Pacheco enganou-se ao ultrapassar um cruzamento onde deveria ter virado. O Diabo iniciara a sua acção subversiva, levando ao engano (e como ele é mestre na arte de enganar!). Refeito o engano, com recurso a esclarecimento pedido num café, a viagem foi correctamente retomada e decorreu normalmente até à quinta.
- Encontro na Casa do Diabo
Chegado à quinta e estacionado o carro no parque, Pacheco dirigiu-se à mesa de controle das inscrições, para regularização da sua presença, após o que se encaminhou para o interior de restaurante. Antes da mesa de recepção e após esta, foi um suceder de cumprimentos entre colegas, apertos de mão, abraços, e beijinhos às esposas conhecidas de alguns colegas. Uns cumprimentos mais profundamente afectuosos do que outros, consoante o grau de intimidade entre os envolvidos. A deslocação para os cumprimentos era acompanhada de paragens para breves conversas com algum colega ou grupo de colegas. Neste movimento, os grupos iam-se alterando, processando-se assim o convívio entre os colegas.
Seguiram-se os aperitivos, o almoço, as sobremesas e, mais tarde, a despedida com bolo comemorativo e espumante. A ementa era constituída por:
- Aperitivos sólidos: camarão, saladas frias, rissóis de camarão, rissóis de carne, caprichos do Alasca, chamussas, pastéis de bacalhau, rolinhos de carne, coxinhas de frango, pãezinhos com chouriço, presunto armado, morcela de arroz, chouriço tradicional, alheira.
- Aperitivos líquidos: martini, gin tónico, moscatel, vinho do Porto, whiski.
- Almoço:
– Sopa: de peixe ou de legumes;
– Peixe: bacalhau com broa à Serra d´Aire, acompanhado de batatinha e salada mista;
– Carne: lombinho com gambas, acompanhado de migas e arroz com legumes;
– Sobremesa: doces, frutas, queijos;
– Bebidas: vinhos, refrigerantes, águas, café, digestivo.
– Despedida: bolo, espumante.
Tal diversidade e quantidade era uma tentação à gula, ao pecado. Tentação que só podia ter o Diabo por trás, e aquele restaurante só podia ser a Casa do Diabo. Um plano friamente urdido, mas que não resultou. O Diabo não conseguiu os seus intentos, pois não se deu pela sua presença. Possivelmente, cedo se terá dado conta que aquele meio não era propício aos seus intentos demagógicos, mentirosos, odiosos, levando ao sofrimento.
Aquela gente que ali se encontrava por bem, já tinha outrora passado por outras investidas do Diabo, já não eram facilmente enganadas. A vida já lhes tinha apresentado dificuldades, rasteiras e falsidades, e com elas tinham aprendido. Fizeram um percurso de vida feito de sacrifício, esforço, tenacidade, perseverança e valor. Vida onde nada lhes foi oferecido, mas tudo conquistado com trabalho, recomeçando do zero, alguns caindo e levantando mais que uma vez.
Esta gente, um grupo especial de uma classe profissional prestigiada, fez deste almoço um convívio de companheirismo e amizade, não havendo, portanto, condições ao comício desestabilizador que pretenderia o Diabo, e onde ele seria o único orador. Assim, o Diabo foi derrotado e em sua própria casa. Venceu o bem e a verdade.
À tardinha, cortado o bolo e bebido o espumante, iniciaram-se as despedidas. Aos poucos, os presentes foram partindo, levando com eles um sentimento de felicidade e de paz, e, porque não, de nostalgia de um tempo que foi tempo.
- Regresso à Casa
Iniciada a viagem de regresso a casa, Pacheco conduzia com os olhos postos na estrada e o pensamento divagando entre o presente e o passado. Revia o almoço de confraternização, os presentes e as conversas tidas, num desfilar de memórias de um passado recente e de um passado longínquo, somatório de pequenos nadas com que foi feito o que cada um é hoje.
Ausente do carro, embrenhado nos seus pensamentos, mas presente, com a concentração na condução, a viagem decorria com a distância rapidamente se encurtando e sem se dar conta do quanto ela era longa.
Chegado finalmente à casa, nova abordagem maléfica do Diabo: a gula do jantar. Mas Pacheco resistiu à tentação, e não jantou. Tomou banho, viu um bocado de televisão e foi deitar-se. Rapidamente adormeceu, dormindo um sono único, sem sonhos com fantasmas e sem pesadelos. Pacheco estava bem consigo e com a sua consciência. O mesmo não poderão dizer os aliados do Diabo, mensageiros da mentira, do medo e do sofrimento.
Pierre Vilbró
Em 2017 foi assim:
No próximo dia 26 de maio, realiza-se o 43º ENCONTRO do IILM. A NÃO PERDER! Clica na imagem seguinte:
O BigSlam deseja que este seja mais um evento repleto de bons momentos… para mais tarde recordar!
3 Comentários
Pierre Vilbro
A todos agradeço as palavras de amizade. Permitam-me que endosse um abraço muito especial ao Mário Paulo, porque dele não tinha notícias há muitos anos, e porque ele foi um dos meus grandes companheiros de estudo.
Julio J Conceicao
Excelente reportagem. Meus parabéns caro Pierre. Um abraço a todos.
Mário Paulo
Grande Pierre abraço a toda malta do iilm