António Fernandes “Gorila” – Imparável na pista “langão” fora delas…
Foi – e continua a ser – um dos melhores amigos da minha vida. Tudo começou na brincadeira, mas o atletismo “selou” – e de que maneira – um relacionamento que posso dizer, com toda a segurança, nem a morte irá ofuscar. Estou a falar de António Sabino Fernandes, Gorila para os que acompanharam a sua carreira no atletismo, nas décadas 60 e 70.
Conhecemo-nos aos 16 anos e essa amizade nunca esfriou, apesar de vivermos em continentes diferentes, há 55 anos, ele em Portugal e eu em Moçambique.
Em LM, o Fernandes trabalhava nas Finanças e eu era operário gráfico no Diário de LM. Ele morava na zona da baixa e eu no Xipamanine. Ele recebia o salário a 20 de cada mês e eu a 30. Nesses dias, tornaram-se obrigatórios os encontros, na Cervejaria Imperial do Alto Maé, onde “espreitávamos” (sem excessos) as loirinhas bem geladas, acompanhadas de amendoins, tremoços e camarõezinhos.
DE FERNANDES A GORILA
Andar desengonçado, lento, como que a pedir licença aos pés, era assim que (re)conhecia o António Fernandes. Nenhum de nós, no início, conhecia as qualidades desportivas do outro.
Mas as surpresas não tardaram. Um dia…
Belenenses-Indo-Português, em juniores, manhã cedo, no campo do Sporting. Vítor Real, árbitro, era o meu treinador. Quando as equipas deram entrada em campo, veio a surpresa.
– Afinal jogas futebol? Sim!
– Tu também? Claro. Em que lugar? A defesa. Eu também.
Não me recordo de quem venceu a partida, mas as cores das camisolas, em nada afetaram a nossa relação.
Porém, o mais bonito estava para vir…
Fomos num fim de tarde ao Sporting.
“Frenesim” total. Futebol, basquete, boxe, andebol e… atletismo nas pistas, com o “infalível” Luís Revez de apito na boca, a orientar. Eu, o “langão” do Fernandes e mais um amigo chamado Vítor, entusiasmamo-nos. Porque não tentarmos a nossa chance, nessa exigente modalidade?
O Luís Revez, disse-nos para voltarmos no dia seguinte. Porém, uma razão qualquer impediu-me de comparecer ao teste com os meus amigos. Quando nos encontrámos dias depois, o amigo Vítor não cabia em si de espanto. Afinal, o “langão” Fernandes, era um “meteoro” nos 100 metros. Não acreditei de imediato, mas comprovei no primeiro teste conjunto, graças ao “bigodão”com que o Gorila me presenteou.
Daí para a frente, as vitórias, tempos e duelos com Magalhães, Poitevin, Castro e outras estrelas da velocidade, falaram por si.
António Fernandes, casado em Moçambique com a amiga comum Isabel Boavida, passou a viver em Portugal e mesmo em fim de carreira, ainda fez umas “gracinhas nos “leões” lisboetas.
Da nossa despedida, pouco depois da Independência de Moçambique, não vou falar muito. Apenas referir que, no momento da “separação” no aeroporto, nenhum de nós conseguiu reter uma lágrima teimosa que nos apareceu no canto do olho. Anos mais tarde, quando o saudoso Carlos Pinhão me abriu a possibilidade de ser o correspondente de A Bola, visitando Portugal algumas vezes, passou a ser visita obrigatória a ida a S. António dos Cavaleiros, onde vive o Gorila, um homem bom e amigão de todas as horas!
Renato Caldeira – Janeiro de 2022
4 Comentários
jose alexandre russell
Lembro-me bem dele. Cheguei a treinar na mesma altura atletismo no SCLM, e de facto o “Gorila” era um atleta de uma força e “explosão” admiráveis. Uma das coisas de que me lembro também era a sua forma peculiar de falar. Grande atleta. Folgo em saber que está por cá, e bem.
Manuel Martins Terra
Uma história de dois desportistas, que após a independência se separaram e que mais tarde o Renato Cadeira o veio a reencontrar em Portugal, para aquele abraço fraterno. Pois é caro Renato, mais importante do que estimar os novos amigos, é preservar as antigas e sólidas amizades. E, efectivamente foi o caso.
Víctor Correia Mendes
Um companheiro de pistas e um amigo desde há algumas décadas, de Moçambique a Portugal onde fomos colegas no SCP, seu clube de sempre.
A sua aparente lentidão, escondia um grande sprinter que foi.
Um abraço
Tomané Alves
Agradeço ao Renato Caldeira a oportunidade de saber do António Fernandes. Coexistimos cada um na sua modalidade no SCLM e também no SCP … em muito menos tempo! Agradou-me sobremaneira saber que está bem. Um grande abraço aos dois.