CARTA ABERTA AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Dedico a transcrição desta “Carta Aberta”, publicada no “Diário as Beiras” (26/10/2017), a todos aqueles que, com os seus comentários à saga que me tem oposto à ADSE, me têm dado alento para continuar a lutar por uma causa que tenho da mais justa Justiça (passe a redundância). Seja-me, contudo, destacar Maria Madalena, minha filha, João Santos Costa, meu antigo aluno da EIMA e actual colega (mesmo depois de aposentado um professor é sempre professor) e Samuel de Carvalho, “alma pater” do “Bigslam”, blogue exemplar de liberdade de expressão. Bem hajam!
Passo a fazer a supracitada transcrição:
“Excelência:
Auferindo minha mulher uma pequena pensão da Segurança Social, de cerca de metade do ordenado mínimo nacional, após 12 anos contributivos, em ofício datado de 17 de Outubro de 2016 da ADSE é informada da inviabilização da respectiva manutenção de cônjuge de benificiário titular, tendo como suporte a disposição do art.º 7.º do Decreto-lei 118/83, de 25 de Fevereiro, na redacção do Decreto-Lei 234/2005, de 30 de Dezembro.
Em 2 de Dezembro de 2016, endossei uma exposição à ADSE em que apresentei um relatório médico, emanado do Centro de Reabilitação Rovisco Pais, atestando a sua “necessidade de vigilância médica e tratamentos constantes por tetraplegia incompleta secundária a mielomalacia”.
Reportava-se a essência da questão da supracitada exposição em saber se esta determinação se aplicava, apenas, a futuras inscrições sem efeitos retroactivos, não abrangendo, consequentemente, o caso de minha mulher inscrita na ADSE, desde o ano de 1975, na sua qualidade de cônjuge de beneficiário titular.
Embora reconhecendo a minha falta de conhecimento “quantum satis” em evocar direitos adquiridos, por ausência de estudos académicos da área da jurisprudência, como tal, apenas como amador (aquele que ama) , em matéria tão complexa e controversa entre os próprios especialistas, mas por outro lado, sentindo o desconforto de expectativas anteriores criadas e depois goradas numa altura da vida “com pesares que ralam na aridez e secura de uma desconsolada velhice”, em citação de Garrettt, recuso-me a cruzar os braços perante uma situação que mereceu da minha parte acerba crítica em quatro artigos de opinião publicados neste jornal, a saber: “A ADSE e as gorduras do Estado” (05/11/2016); “O Partido Socialista, a ADSE e a ‘praga cinzenta’” (14/09/2017); “A ADSE e o ‘soberaníssimo bom senso’ preconizado por Antero” (29/09/2017); “O ziguezaguear da ADSE” (17/10/2017).
Fazendo eu fé de que “o homem livre é aquele que não receia ir até ao fim da sua razão” (Jules Renand), predispus-me a escrever esta “Carta Aberta” a Vossa Excelência, com respaldo no vosso humanismo em defesa dos que sofrem, para lhe dar conhecimento público da injustiça representada pela impossibilidade de inscritos continuarem com o estatuto de cônjuges de beneficiários titulares na parte derradeira de suas vidas.
Desde a publicação desta legislação até à sua aplicação mediaram 33 anos, quiçá, pelo receio de ela poder vir a ter reflexos negativos em posteriores eleições nacionais, até que, em euforia do estado de graça do Partido Socialista, foi ela despertada do seu estado de letargia despejando para um Serviço Nacional de Saúde, a rebentar pelas costuras, nova “clientela” originária de vários subsistemas de saúde convencionados.
E este “statu quo” é tanto mais insólito por não se tratar de acudir a fogos de uma ADSE em falência. Uma auditoria anterior do Tribunal de Contas denunciou que o “Governo está a financiar à custa da ADSE por os funcionários públicos estarem a pagar mais 228 milhões de euros do que seria necessário” (“Expresso”, 17/07/2015). Tempos antes, noticiava o semanário Sol (18 de Julho de 2015 ) haver doentes que tem de recorrer a consultas privadas de Dermatologia por elas poderem levar anos a serem feitas no Serviço Nacional de Saúde.
O que constatamos nós, hoje? Com o título, “Tutela ‘falseou’ tempos de espera nos hospitais” é noticiado aí que o acesso a consultas e cirurgias piorou nos últimos três anos e que , entre 2014 e 2016, mais de 27 mil doentes ficaram em lista de espera por uma cirurgia e mais de 2600 morreram antes de serem operados (Público, 18/10/2017).
“Ergo”, quantos ex-cônjuges de beneficiários titulares terão que entregar a alma ao Criador por passarem a ser novas vítimas deste calamitosa situação, numa altura em que o Conselho Geral de Supervisão da ADSE se limite a debitar publicamente, depois de demorados conciliábulos, o agravamento draconiano da idade de 65 para 60 anos, como data limite para inscrições de novos cônjuges, deixando em dúvida se a exclusão de inscritos, em data anterior à publicação da legislação em causa, é para se manter. E se for esse o caso, responsabilizar os seus autores por depressões graves em velhos e doentes, em grande sofrimento por esta verdadeira epidemia do nosso tempo que reforça o conselho do médico psiquiatra brasileiro, Augusto Cury: “Nunca desprezes as pessoas deprimidas. A depressão é o último estágio da dor humana”.
Finalmente, por considerar que se trata de importantes questões de natureza social, por atingirem pessoas velhas e doentes, por vezes, em situações em que, como sói dizer-se, se vão os anéis para ficarem os dedos, “no uso da licença da liberdade de quem não pede favor senão justiça”, como foi hábito de vida do padre António Vieira, submeto-as , como “ultima ratio”, à consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
Rui Baptista
7 Comentários
Rafael Rodrigues Nunes
Mais nada se pode acrescentar ao que disse num português,que exprime a extrema injustiça a que estamos sujeitos por leis feitas por indivíduos que deviam passar por estas situações antes de tomar tais decisões.
Rui Baptista
Quem faz leis injustas tem o cuidado prévio de não se reflectirem sobre interesses pessoais de quem as assina. Ou não têm país doentes e velhos ou se têm são maus filhos, como tantos que se vêem neste mundo de Cristo..
Antonio Pereira da Silva
Bem haja amigo prof. Que tudo lhe corra bem. Espero que seja feita justiça. Um abração. …………………..
Antonio pereira da silva
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Rui Baptista
Que bem me sabe a solidariedade e amizade de um antigo aluno para mais com dois apelidos do meu nome completo: Rui Vasco Júlio Pereia da Silva Baptista. Dois abrações.
Maria Madalena
Meu muito querido Pai, as tuas lutas são sempre justas e bem fundamentadas. Pena que alguns, a maioria dos políticos, se esqueçam que respeitar os direitos dos idosos é preparar o seu próprio futuro, um futuro mais digno e com a devida qualidade de serviços de assistência médica. Vamos esperar que o humanismo e a sabedoria do Presidente prevaleçam sobre as políticas economicistas. Bem hajas tu por seres um exemplo de perseverança e por fazeres um uso tão produtivo da caneta e do conhecimento nas tuas lutas pela justiça, pelos direitos e essencialmente pelo Amor que colocas neste desafio.
João S.Costa
Dizes bem Madalena! “….Vamos esperar que o humanismo e a sabedoria do Presidente prevaleçam sobre as políticas economicistas….” Eu digo mais! – Que faça pressão para que estas situação, e outras que ferem a dignidade das pessoas, não se repitam.
Rui Baptista
Querida filha: Ainda esta noite penso enviar para, os cuidados do Bigslam, um “Bilhete Postal a Madalena e João”. Beijinhos.