SALAZAR: “NÃO BATE A BOTA COM A PERDIGOTA”
“Tudo seus avessos tem”
Sá de Miranda
Li o artigo “Fala o pobre”, da autoria da escritora Hélia Correia, em que se debruça sobre o período da história do Estado Novo e do respectivo Ministro da Presidência: António de Oliveira Salazar.
Desse artigo, respigo:
“Antes de 25 de Abril de 1974 nem sequer nos achávamos na cauda da Europa: estávamos sim, nos subterrâneos sem a ver. De vez em quando, alguém a alcançava, fugindo à variadas instâncias de Polícia que iam mudando o nome mas não a crueldade. Assim, fugiram os judeus, fugiram sábios, académicos médicos, cientistas que, entre, entre os altos espíritos da Europa, tomaram com justiça os seus lugares. Escritores respiraram o ar fresco das grandes literaturas românticas, realistas, e trouxeram de volta requintes e ideias. Em Paris onde tudo sucedia, poetas e pintores pousavam as malas. A Europa era o ‘lá fora’ e era tudo.
Veio o salazarismo e esmagou com os pés, durante 50 anos, todas as nucas que tentassem levantar-se. Não eram pés calçados em botas cujo estrondo levava o horror aos próprios buracos das toupeiras. O inquisidor usava sapatinhos de padre ou de funcionário das finanças que eram discretos na aproximação. Pensava tanto no agrado da Igreja como na salvação do seu regime. Não tinha suficiente teoria mas também não sentia a falta dela. Ao longo desse tempo prosseguiu a viagem clandestina para a Europa” (Público, 01/07/2016).
De entre as personalidades que “fugiram às variadas instâncias da polícia” (Hélia Correia), vivendo um longo período de exílio no estrangeiro em oposição ao Estado Novo, destaca-se, sem dúvida, um antigo militante do Partido Comunistas Português, António José Saraiva, segundo Eduardo Lourenço, “uma referência-chave da cultura portuguesa, que, numa entrevista, referindo-se a Salazar, declarou:
“Desde sempre senti uma certa admiração por Salazar. Ela vinha, primeiramente, dos seus escritos, que têm grande categoria e que são a melhor exposição doutrinal (que eu conheço) da chamada direita. E vinha também da sua atitude de dignidade, muito própria de camponês. No fundo, admirava-lhe isso. Mas não concordava com a ditadura que ele impunha, com a censura, com a repressão. Foi isto que me levou à incompatibilidade, a partir dos 22 anos”. E prosseguia o entrevistado: “O Salazarismo é uma tentativa empírica de resolver o problema português, o problema da identidade nacional e da continuidade histórica. Mas não podia sobreviver, Reconheço , porém, que o progresso económico nesse período foi notável: quando dizem que Salazar era exclusivamente um financeiro, isso é errado. As grandes obras públicas que então se fizeram em Portugal – o país está cheia delas, desde o Parque de Monsanto ao Hospital de Santa Maria e à ponte sobre o Tejo. E o mesmo em relação *as infra-estruturas: foi sob o salazarismo, de acordo com o Plano de 1936, que se fez a electrificação sistemática do país. E quando Salazar fez consagrar na Constituição de 1933 o princípio do equilíbrio orçamental, estava simplesmente a defender algo que hoje vemos ser elementar: que o país não pode endividar-se, da mesma forma que um homem pobre não o pode fazer. Só os ricos podem ter dívidas!”
Questionado se ao lerem as suas declarações não dirão “o António José Saraiva converteu-se ao salazarismo”, respondeu:
“Não, não! De forma alguma. Tenho de resistir a essa tentação! Apenas reconheço que, quando se fizer uma História de Portugal e nela forem destacadas cinco ou seis homens representativos de ‘uma vontade portuguesa de ser’ um deles será Salazar. E será também um exemplo dos exemplos de dignidade, Repare no ‘pessoal’ de agora!” (O País, 11/02/1982).
Toda a tese tem antítese, caberá ao leitor, despido de preconceitos, fazer a respectiva síntese. Embora se reconheça a referida dificuldade:
Onde Sancho vê moinhos / D. Quixote vê gigantes. / Vê moinhos? São moinhos. / Vê gigantes? São gigantes”
(António Gedeão).
3 Comentários
Fernando Alves
Se Salazar tivesse dado a independêcia ás colónias antes da guerra começar, hoje podíamos lá estar todos…
João José Marques
Se Salazar tivesse dado a independência às colônias antes da guerra, a guerra teria começado à mesma e provavelmente teria sido muito mais terrível. Não me parece plausível achar que os movimentos de libertação concordassem com qualquer outra solução que não lhes entregasse o poder nas mãos.
César Azevedo Rodriugues
Uma coisa é certa neste mundo. Quem deve teme, quem não deve não teme. O devedor nunca é independente