35º Almoço do Desportivo de Lourenço Marques
Homenagem àquele que foi o melhor futebolista moçambicano de todos os tempos: Fernando Ventura Lage
Por: Alexandre Franco
Vou começar por dizer que sou a pessoa menos indicada para escrever algo sobre um almoço, o 35º convívio anual de adeptos, atletas e simpatizantes daquele que foi o “Glorioso” de Lourenço Marques, o “Glorioso” de Moçambique, até porque durante muitos anos foi filial do “Glorioso” de Portugal, o Sport Lisboa e Benfica. Portanto, e desde já as minhas desculpas, mas claro que não podia dizer que não ao pedido do meu conceituado amigo Samuel Carvalho.
Muito embora com apenas cinco anos de idade eu tivesse sido atirado para dentro da piscina do Desportivo e de até aos 14 anos de idade tivesse vivido os meus dias naquele maravilhoso ambiente alvi-negro, todos sabem que desde então “atravessei – ou saltei – o muro” e passei a ver verde-e-branco, ou como diriam os meus amigos do Desportivo, passei a ser “chacal”.
A história é longa (tem a ver com uma rejeição do Alberto Correia Mendes e com um abraço de boas vindas do tão popular José Lopes), mas nada tem a ver com o assunto que agora está em causa e, por esse motivo, fico-me por aqui.
Quanto ao titulo deste artigo (mais em jeito de reportagem do que outra coisa), permitam-me que dê uma explicação. Já há muitos anos que afirmei (e está escrito em diversos jornais) que Fernando Adrião foi o melhor hoquista do mundo, de sempre; que Mário Albuquerque foi o melhor basquetebolista moçambicano; e que Fernando Ventura Lage foi o melhor futebolista moçambicano de todos os tempos. De imediato surgiram os “ataques”, pois a grande maioria fala de imediato em Eusébio da Silva Ferreira ou de Mário Coluna (também eles fabulosos). Todavia, como o famoso “Pantera Negra” (que futebolisticamente merece todo o meu respeito, pelo que fez em Portugal), ao renegar ao facto de ter sido futebolista do Sporting Clube de Lourenço Marques, não merece – em termos moçambicanos – ser considerado melhor do que um fabuloso Fernando Lage. Poderá ter sido o melhor futebolista de Portugal, mas só quem não viu jogar Fernando Lage é que não acredita na minha afirmação. Eu vi Fernando Lage jogar a guarda-redes, a defesa, a médio, a avançado. Envergar esta e aquela camisola de equipas de atletismo e de basquetebol. E foi dentro de todo aquele ecletismo que Fernando Lage brilhou, com destaque muito especial para o futebol.
Perguntar-me-ão: Então por que razão Fernando Lage nunca jogou em Portugal (se é que eu consigo diferenciar a então Metrópole do atual Portugal, em relação à então Província de Moçambique e atual Republica de Moçambique)? Porque ele nunca quis. Ele nunca quis sair de Moçambique. Tinha a sua vida bem organizada. Era feliz. E o profissionalismo futebolístico não era algo que o atraísse. Aliás tal como aconteceu com aquele que para mim foi o melhor guarda-redes de futebol de Moçambique, de todos os tempos, que também nunca quis sair de Moçambique e dava pelo nome de Pedro Santos, irmão do Álvaro Santos (que esteve presente a este almoço). E agora, peço a vossa comiseração, pelas afirmações que faço e que são opiniões muito pessoais que espero que respeitem, tal como eu respeito todas aquelas que não estiverem de acordo com as mesmas.
No próprio almoço, um grande amigo, ao ouvir a minha afirmação sobre o Pedro Santos, perguntou-me: Alexandre, não te estás a esquecer do Octávio Sá? Claro que incluo Octávio Sá no topo dos topos. Foi, simplesmente, maravilhoso, mas também tivemos muitos outros atletas espetaculares nas mais diversas modalidades desportivas, os quais também considero e onde até incluo gente boa que cresceu comigo, como foram os casos do Manuel António (que quando júnior, ao lado do Eusébio, até era considerado melhor jogador) e do seu irmão Frederico Costa. E podia fugir, mais uma vez, à razão deste artigo, mas vou tentar evitar que isso aconteça.
Para que esta 35ª edição do almoço do Desportivo de Lourenço Marques, terei que destacar, em primeiro lugar, dois nomes deveras importantes: Zé Pedro Flores Cardoso e Mário Silva.
Mário Silva e José Pedro Flores Cardoso
A alma, o espírito, a verdade, o suor, a realidade que merece o nosso aplauso, ao conseguir reunir centenas de moçambicanos, na sua grande maioria “malhados” (permitam-me a expressão que era tão popular, particularmente depois de já ter deixado nestas linhas o nome pelo qual eram conhecidos os rivais do outro lado do muro), mas também adeptos e ex-praticantes de várias modalidades desportivas, de outros clubes, com grande destaque para os do Sporting Clube de Lourenço Marques e do Ferroviário de Lourenço Marques.
Um dos responsáveis, também ele muito “alvi-negro”, Mário Silva, disse ao BigSlam o que é esta maravilhosa reunião de moçambicanos, por isso julgamos ser importante reproduzirmos as suas palavras:
Este foi o 35º Almoço do Desportivo.
Esta ideia começou em 1980 numa roda de amigos onde eu participei, com o Carlos Alemão, Edgar Costa, Zé Arruda, Nini Melo, Jorge Viegas e o Zé Pedro. Sinceramente, não me recordo se mais alguém fez parte deste grupo. Eu quase garantiria que sim.
Na verdade o primeiro encontro não foi um almoço, mas sim um jantar, numa casa de fados (Márcia Condessa), que existia na Praça da Alegria, e penso que deveríamos ser no total umas 20 pessoas.
No ano seguinte, o local escolhido foi o mesmo e a data do convívio foi o dia 4 de setembro de 1981. Esse foi o segundo jantar (com fados) que custou 530$00 (hoje: € 2,65).
Já com o Quim Neves integrado, passámos para o Hotel Roma, por especial deferência do Coronel Alfredo Neves. Então sim, passámos a fazer os almoços de confraternização.
A partir daqui mais um ano no Hotel Roma. Depois no Restaurante do António Souto – Montes Claros em Monsanto e eis que passámos para Belém, onde, aí sim, estivemos mais de uma dezena de anos.
A partir do Hotel Roma, o grupo responsável pela organização era composto por mim, o Quim Neves, Zé Pedro, Carlos Alemão e Viegas, e manteve-se assim por muitos anos.
Com o passar dos anos, o grupo vai-se desfazendo, e sendo substituído por outros, casos da Dulce Gouveia, o Mitas, o Arlindo Tavares. Nas também por isto ou por aquilo, as coisas vão-se alterando e só uma pessoa se mantém firme no seu “posto”, o Zé Pedro Flores Cardoso.
Com a sua capacidade de mobilização, organização, de luta (quantas vezes tão difícil) como um verdadeiro “capitão”, ano após ano, vai mantendo esta organização de pé, e dá-nos a garantia de que “vamos continuar”, a ter o nosso almoço de confraternização.
Alvi-negro de “gema”, criado no Desportivo, só ele consegue manter bem viva e acesa a nossa “chama” e manter esta “família” bem unida. É um daqueles casos em que penso que sem ele, isto já teria “morrido.
Por isso Zé Pedro, tenho a certeza que expresso o sentimento de todos os alvi-negros ao dizer – OBRIGADO, ZÉ!”
Estivemos no Restaurante Regiões, situado na Estrada de Paço de Arcos, Alto da Bela Vista Pav. 2, Cacém.
(Na estrada que liga Oeiras, Tagus Park, São Marcos à IC 19), tal como quase trezentos outros moçambicanos ou de algum modo ligados a Moçambique.
E usando as palavras de um dos presentes: “A exemplo do que vem acontecendo ao longo dos anos, mais uma vez esta festa constituiu um assinalável êxito, e se qualquer festa é alegria, o 35º Almoço do Grupo Desportivo de Lourenço Marques foi um grande momento, num saudável espírito de amizade e fraternidade.”
O Grupo Desportivo de Lourenço Marques, que foi fundado no dia 31 de maio de 1921, pelo Prof. Sá Couto, José Maria Rodrigues, Alfredo Cardoso, Américo Costa, Martinho Carvalho Durão e o Professor Cabanelas,
conquistou o seu primeiro titulo de campeão de Lourenço Marques, em 1925. Desde então foi um somar de títulos com a grande participação na maioria deles do “jovem” agora homenageado, Fernando Lage,
assim como daquele que também foi um “monstro” e que merece ser recordado, Mário Coluna. E hoje, em 2014, continua a ser um grande campeão.
José Faria veio do outro lado do mundo, os irmãos Narcy, desde Moçambique, eu e o Jorge Campos, deste Toronto, no Canadá, e o “Mr. Basquetebol Moçambique”, Luís Pina, que acaba de bater mais um recorde mundial ao atuar durante uns minutos num jogo de basquetebol da sua ultima equipa, a da TAP, com a linda idade de 85 anos, e que se lembrou de fazer uma homenagem (imerecida) a este vosso amigo, oferecendo-me três garrafas de vinho com o rótulo de “Mestre Franco”.
Eu que nunca fui “Mestre” de coisa nenhuma (ah, fui Mestre de Cerimónias, algumas vezes), até chorei. É sempre agradável quando alguém se lembra de nós, nem que seja pelo pouco que procurámos dar àquele que foi o Basquetebol Moçambicano (e algum, muito pouco, como treinador do Queluz, em Portugal).
E para “rematar”, quero aqui agradecer o par de botas de futebol (ainda eram aquelas velhinhas com travesseiras) que o Fernando Lage me ofereceu quando eu era um “putozinho”, nas bancadas do velho Campo João da Silva Pereira (era o campo do Sporting Clube de Lourenço Marques), algo que me marcou para toda a vida.
De recordar que eu fui o porta-estandarte do Grupo Desportivo de Lourenço Marques na Parada, no Estádio Paulino Santos Gil, quando da visita do Presidente da Republica General, Francisco Higino Craveiro Lopes, usando as botas que o Dank Mar me emprestou (eram as únicas que me serviam) e tinha eu para aí uns dez anitos, ou coisa parecida. Como foi maravilhoso recordar todos estes acontecimentos mais de 50 anos depois.
Foi o 35º Almoço e já estamos ansiosos pelo 36º!
Presentes quase 300 pessoas o que devia fazer com que eu fosse esperto e não mencionasse o nome de ninguém, para não ferir suscetibilidades. No entanto (e desde já a pedir desculpa pelo facto de não conseguir inserir os nomes de todos quantos estiveram presentes), aqui vão os nomes daqueles que me ficaram mais na retina: Fernando Lage, Mário Wilson (como foi fabuloso ter estado com este gigante do futebol moçambicano e português), Rui Rodrigues, Mandioca, Mário Lage, Yula Lage, Manuela (Lelé) Botelho de Melo, Dulce Gouveia, Zé Arruda, Sekonkas Chiu Arruda, José Naldo, Álvaro (Varito) Santos, Zé Borrego, Eduardo (Mitas) Cruz, Ernesto Meireles, Fernando Simões, Amílcar Passos, Titi, Armando Ferreira da Silva, Arnaldo Salazar, Libório, Carlos Jóia, Eurico Catoja, João (Pinduca) Vicente, Carlos Alemão, Tau, Octávio Vicente, Carlos Dias, Sérgio Albasini, Paulo Carvalho, João Silva, João Ferreira, Samuel Carvalho, José Pedro Flores Cardoso, José Reis, Benjamim Ferro, Mário Aguiar, Carlos Otão, Alberto Rodrigues, Bonifácio Dias, Augusto Lopes, Luís Pina, Mário Albuquerque, Francisco Velasco, Nelson Serra, Luís Fonseca, Jojó Monteiro, Luís Morais, José Faria, Nuno Narcy, Isac Narcy, Jorge Campos, João Romão, Artur Gama da Fonseca, Mário Ramalho, Tonocas “Maravilhas” Magalhães, Rui Carvalho, António Rendas Pereira, Armindo Costa, Vasco Abreu, Vasco Marques… E mais duzentos e tal, que me perdoem por não inserir os seus nomes.
Agora vejam o vídeo de homenagem ao Fernando Lage, concebido pelo Mário Silva:
Nota do BigSlam:
Não percam as reportagens fotográficas deste evento. Clicar nos links seguintes (escritos a azul):
Reportagem fotográfica do 35º Almoço do GDLM e homenagem a Fernando Lage – (1ª parte)
Reportagem fotográfica do 35.º Almoço do GDLM e homenagem a Fernando Lage – (2ª parte)