7 ANOS DEPOIS !
Na manhã do dia 11 de Maio de 2008, estava eu em Pretória, cumprindo a minha missão de correspondente da Rádio Moçambique na África do Sul e eis que começo a ouvir na Radio 702,
uma das rádios de maior audiência daquele País que se dedica fundamentalmente à informação, a notícia de distúrbios nos bairros periféricos de Joanesburgo, com uma grande incidência em Alexandra. À medida que o tempo foi passando, outros bairros foram sendo alvo de actos de xenofobia. Começo a ouvir falar em Benoni, Soweto (o Soweto pobre, entenda-se) Meadowlands, Mamelodi, Khayelitsha e por aí fora.
No mesmo dia recebo um telefonema do Alto Comissário de Moçambique na África do Sul, Fernando Fazenda, convidando-me a integrar uma comitiva que era chefiada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Dr. Oldemiro Baloi, que “chega amanhã e pretende visitar os locais onde os moçambicanos estão refugiados”. No dia seguinte ao eclodir dos ataques fomos a alguns dos bairros periféricos das cidades de Pretória e Joanesburgo para verificar “in loco” como estavam a se organizar (e a defender) os nossos compatriotas, que duma forma desenfreada, fugiam dos actos bárbaros que estavam a ser cometidos. Fomos com escolta policial, porque de outra maneira era impossível chegar aos locais de refúgio.
Na ocasião entrevistei alguns dos nossos compatriotas que fugiram em debandada das suas casas. Eram homens, mulheres e crianças que transportavam consigo os parcos haveres que conseguiram recuperar. Em todos eles vi a imagem da dor, da desolação e também de indignação. A morte que tirou a vida a mais de 50 cidadãos estrangeiros. Foram 100 mil os que fugiram dessa onda de criminalidade, de entre os quais cidadãos de Moçambique, Zimbabwe, Congo, Burundi, Ruanda, Somália e Etiópia. Gente vitimada pela globalização do desemprego e pelo aumento da miséria. Gente que só tinha uma diferença em relação à maioria daqueles que os atacaram: eram estrangeiros.
Na altura ThaboMbeky
fez ouvidos de mercador aos recados que lhe iam chegando, de alguns sectores da sociedade civil e até de alguns embaixadores africanos e europeus, sobre a onda de insatisfação geral da população, especialmente a mais carenciada, que vivia (e ainda vive) em bairros pobres, a precisar de saneamento do meio, água potável, energia, escolas, telecomunicações, transporte e postos de saúde. As críticas sobre a forma como o Governo (na altura) lidou com a situação abalou ainda mais a credibilidade do já enfraquecido presidente Thabo Mbeky.
Recordo-me que um dos principais jornais da África do Sul, o Sunday Times estampou a seguinte manchete: “Sr. Presidente, renuncie, agora”. Mas Mbeky não saiu. Acabou por sair (obrigado a renunciar) em Polokwane em Setembro de 2008, quatro meses depois do eclodir dos actos de xenofobia.
Ficou claro que em 2008 tal como hoje, o Governo não tinha (nem tem) um plano estratégico para lidar com a crise que se abateu e ainda se abate sobre aquele País, considerado um dos mais desenvolvidos do Continente Africano. Fez-se uma operação cosmética de apagar o fogo, esquecendo-se de que o fogo poderia reacender. Ontem como os comunicados e as aparições nas televisões. Eram os lamentos. Eram os apelos à calma e ao fim da violência xenófoba. Foi assim com Thabo Mbeky. É assim com Jacob Zuma. Em 2008 foram detidos alguns sul africanos que de acordo com a Polícia, estiveram directa ou indirectamente envolvidos nos actos de xenofobia. Até hoje ninguém soube que penas foram aplicadas a esses indivíduos. Agora em 2015 quero acreditar que vai acontecer o mesmo.
Chamem-lhe “afrofobia” (como referia o Sunday Times de Joanesburgo) ou xenofobia, o certo é que os africanos estão a ser mortos numa África do Sul que se diz “rainbow nation”
e com princípios “ubuntu”, uma filosofia africana cujo significado se refere à humanidade para com os outros. Para os africanos ubuntu é a capacidade humana de compreender, aceitar e tratar bem o outro.
Ubuntu significa generosidade, solidariedade e compaixão com os necessitados e o desejo de felicidade e harmonia entre as pessoas. Princípios que o Rei Goodwill Zwelithini e Eduard Zuma (filho do presidente do ANC e da África do Sul) deitaram no caixote do lixo.
Desemprego e pobreza não podem ser justificações para tanta barbárie junta. Quando o rico é cada vez mais rico e o pobre é cada vez mais pobre, dá nisto.
João de Sousa – 22.04.2015
Um Comentário
Clara Van Zeller
O Homem descamba para a animalidade mais frequentemente do que gostaríamos.
E, com a agravante, de que tal se verifica até aos dias de hoje.