AS CONVERSAS DE MASSACA!
Estolano, meu amigo de infância encontrou-me a semana passada nas proximidades da sua casa em Boane, para onde se mudou porque “estou farto da selva que se chama Maputo”. Longe do bulício dos carros, longe dos prédios que a cada dia que passa vão ficando mais sujos, excepção seja feita aos que estão inseridos no projecto “Chonga Maputo”, longe das tagarelices dos vizinhos, das fofoquices do dia a dia.
Ele agora respira ar puro, paz, sossego. Reformado não precisa de mais nada. Ou melhor, precisa sim duns trocados no bolso para o que der e vier. Vai cuidando das hortícolas e do seu jardim. Aos fins de semana confronta-se com a “malta de Maputo” que vem passar o fim de semana em Massaca. Aqueles que foram construindo uma espécie de “casa de férias”. Chegam com bagagem e mantimentos na sexta feira à tarde e dali saem no domingo à tarde depois do almoço. O restaurante da zona é sempre o ponto de encontro para os petiscos do costume, sempre bem regados.
Como é patrão de si próprio, Estolano tem tempo para tudo. Vai trocando conversa com os que chegam de Maputo para o fim de semana mas também com amigos e antigos colegas de profissão, nomeadamente os da secção de via e obras dos Caminhos de Ferro de Moçambique, que aos sábados “dão um salto a Boane para colocarmos a conversa em dia”. Colegas com quem ele calcorreou quilómetros e quilómetros deste País na montagem e reparação de linhas férreas. São estes os companheiros do antigamente, uns morando em Maputo, Matola ou Machava, também eles reformados, que se juntam com regularidade para uma “sueca”, o jogo de cartas muito popular em países de expressão portuguesa e onde os parceiros em hipótese alguma podem conversar entre si, sob pena de se cancelar a rodada e iniciar uma outra. Talvez por isso se diga que a “sueca” é um jogo de mudos.
Quando se fartam do jogo das cartas a conversa descamba para a política, campo fértil para cada um fazer as mais diversas conjecturas. Lá vem a história dos ilícitos eleitorais, das promessas de campanha que andam a ser feitas e que dificilmente serão concretizadas, dos namoros feitos nas confissões religiosas, especialmente por aqueles que andaram sempre de costas voltadas para com a Igreja, dos duzentos mil meticais que se paga por um lugar numa mesa, só para estar ao lado dum presidenciável numa clara acção de oportunismo e com o olho posto nas “benesses” que o futuro reserva, do veículo topo de gama oferecido e posteriormente devolvido à procedência, que prova, como escreveu o meu bom amigo João Cardoso, “a existência dum empresariado pobre de valores, pobre de sentido de responsabilidade social, pobre de visão, pobre de humanismo, pobre de humildade, pobre de amor e respeito pelo País e pelo seu povo”, das ameaças do “olho por olho, dente por dente”, da linguagem tribalista ao estilo “se fazem isto em Gaza, nós vamos responder aqui na Zambézia”, das confrontações violentas que podem colocar em perigo esta paz. A paz que gostaríamos que tivesse vindo para ficar e que temos de manter seja a que preço for. Não precisamos duma paz podre. Duma paz negativa. Não é por certo com este comportamento caracterizado por toda a espécie de pronunciamentos inflamatórios, com paus, pedras, catanas e tiros que vamos ser felizes e criar o ambiente para que os nossos filhos e netos o sejam também.
A semana passada nas conversas de Massaca, veio à baila esta história das diferentes gerações moçambicanas. De 25 de Setembro, de 8 de Março ou da Viragem. Estolano não pertenceu a nenhuma delas. Ele continua a ser da geração do bom dia, do por favor, até logo e obrigado. Da geração que, sem se “abotoar” do bem alheio, sabe respeitar, sabe pedir permissão, sabe saudar com um sorriso e sabe amar as pessoas pelo que elas são e não pelo que elas têm. Que não entra no campo da gabarolice, que se preocupa mais com os factos reais e não com as aparências. Ele continua a ser o Homem Novo (como dizia Zeca Afonso) que sem vir da mata não se deixou deteriorar com o falso verniz dos efémeros e fúteis modernismos surgidos no nosso País no pós 25 de Abril de 1974. Parafraseando um cançonetista brasileiro atrevo-me a dizer que “Estolano é que é homem de verdade”.
OBS: Massaca é um bairro (ou aldeia? ou localidade?) do distrito de Boane, província de Maputo.
João de Sousa – 08.10.2014
2 Comentários
ANSELMO DO CARMO GOMES (TONDELA)
Simplesmente fantastico. Gloria, gloria para esse fabuloso desportista do nosso Mocambique. Abencoada casa que bons filhos deu e da. Um abraco do tamanho do Mundo ” PARA A GENTE DA MINHA TERRA”.
carlos silva
Caro Anselmo do Carmo Gomes,mais conhecido por Tondela
Prezo saber que estás vivo e a participar no nosso Big Slam.Se não estou enganado,viveste no Bairro Arcas na Caldas Xavier e tinhas ou tens uma irmã de nome Generosa.Pois já lá vão talvez mais de 60 anos passados….velhos tempos.Era miúdo,mas ainda me lembro de ti,do Puskas,Libote,Ótavio Vicente,da cantina dos pais da Skonkas,ChopChop e outros que agora me não recordo.Gostaria de saber como estás e por aonde andas.Se leres este comentário,dá noticias.Vivo em Faro e o meu email é Csilvalm@gmail.com e o tel 917630283.