AS GORDAS PROMESSAS
Não gosto de me envolver em questões que suscitem polémicas. Em que uns, sentindo-se ofendidos, atacam o autor da reflexão e não o conteúdo desta. Outros, por mero oportunismo, disparam farpas acusando-o de antipatriotismo. Mas é em respeito ao mais profundo patriotismo – para não dizer nacionalismo – que partilho com quem me estiver a ler, as linhas que se seguem. Este meu escrito nada mais é do que um convite para que a sociedade moçambicana exija ser tratada com mais seriedade pelos políticos, alguns dos quais só aparecem depois de uma longa hibernação ou sono letárgico quinquenal, que dura entre duas campanhas eleitorais.
As campanhas políticas em Moçambique vêm, eleição após eleição, apresentando um mesmo enredo: na busca desenfreada de votos, o candidato (ou o partido) faz gordas promessas, mas, quando no poder, entrega magras realizações. É incrível como os nossos políticos são criativos na hora de prometer, mas agudamente incompetentes no momento de honrar a palavra empenhada. O filme da ilusão do povo é conhecido.
Foi assim na campanha eleitoral para as autárquicas de Novembro do ano passado. Prometeram-se mundos e fundos. Volvido este tempo todo, nada ou quase nada foi feito. Aqui e ali os remendos. As acções esporádicas de melhoria, num país que, independentemente dos seus níveis de crescimento, continua a ver decrescer o nível da qualidade de ensino. Não estou a inventar nada. Responsáveis do Ministério da Educação disseram isso publicamente.
Estamos num País que se confronta (salvo raríssimas excepções) com deficiências de toda a ordem no que aos cuidados de assistência médica e medicamentosa diz respeito. Um país que vive mergulhado em problemas graves de saneamento do meio ambiente, e que não encontra soluções para socorrer milhares de pessoas que vivem ainda sem energia e água potável. Um País que tem um sistema de justiça que não é exemplo para ninguém. Quem tem musculatura financeira consegue resolver os problemas num piscar de olhos. Quem não tem, fica a ver navios. Um País com um nível de pobreza que atinge 11 milhões de pessoas, do total de 24 milhões da nossa população. Só em Maputo o índice de pobreza atinge 47%.
Está provada a total e completa incapacidade do actual executivo em resolver o problema do transporte público, obrigando os munícipes a serem transportados como gado. Segundo se diz à boca cheia “caso o meu partido vença as eleições de 15 de Outubro, acabam-se os my love passando os cidadãos a serem transportados em condições mais condignas”. Perante esta afirmação não deixa de ser interessante a pergunta do Professor Carlos Serra, que rebusco para este meu escrito, com a devida vénia: “porque não se desmylovou durante estes anos todos ?” É doloroso saber que foi o próprio Estado que autorizou esta situação.
Não há indícios de melhoria da vida dos que utilizam as suas viaturas para se deslocarem de casa para os seus locais de trabalho e que se confrontam diariamente com um trânsito infernal. A situação em vez de melhorar, tende a agravar-se. Para justificar o desenvolvimento e crescimento económico de Moçambique opta-se pelas comparações entre o que tínhamos em 2004 e o que temos hoje, volvidos 10 anos. Estão a incutir nos cidadãos a ideia de que os da primeira ou da segunda república, nada fizeram. Afinal os outros é que eram o sinónimo do “deixa-andar”.
Em tempo de campanha promete-se tudo. Num abrir e fechar de olhos tudo vai acontecer. Tudo vai ficar resolvido. Tudo vai mudar. Em tempo de campanha vale esfregar as mãos duma senhora com vinte mil meticais para que ela participe na campanha dum determinado partido político, gritando vivas ao candidato que ela não conhece de lado algum, que nunca viu nem mais gordo nem mais magro, mas que afirma ser o candidato do povo, que veio para mudar tudo e para resolver os problemas “deste nosso belo e querido Moçambique”. No dia seguinte essa mesma senhora, provavelmente a troco duma camisete, dum boné, duma capulana ou dum naco da pão e de um quilo de açúcar, é vista a fazer campanha a favor dum outro candidato e dum outro partido.
Mais grave do que isso é ver crianças em idade escolar, algumas delas com uniforme da sua instituição de ensino a pedir votos a favor dum determinado partido político. Lugar de criança é na escola.
Quem ouve a rádio e vê os nossos canais de televisão confronta-se todos os dias com este tipo de gente. Pessoas compradas que são manipuladas conforme as necessidades deste ou daquele. Ensinadas a reproduzir o que os outros querem que seja dito. A troco de meia dúzia de quinhentas (por vezes bem gordas) vendem a sua própria dignidade. Dizem publicamente aquilo que não lhes vai na alma, mas sim o que quem manda acha que deve ser dito. Dizem-se adeptos de A de B e de C, mas na prática são adeptos do muito taco que foi e continuará a ser distribuído no decurso desta campanha e que lhes vai cair no bolso sem o mínimo esforço.
São estes e outros que não se importam em conspurcar as cidades e vilas deste País, colando todo o tipo de material de campanha em locais impróprios e proibidos, como por exemplo nas placas de sinalização de trânsito, ou nas instituições públicas.
Há infelizmente gente que, à custa de alguns (por vezes chorudos) meticais, perde completamente a noção do que anda a fazer. Perde a noção de cultura, de urbanismo, das boas maneiras, de respeito, de civismo. E ainda por cima aparece nas rádios e televisões “a arrotar postas de pescada”.
João de Sousa – 10.09.2014