O “MOLINHAS”
Por João de Sousa
Victor Morgado
Um dia destes, já lá vai algum tempo, entrevistei para um dos programas desportivos da Rádio Moçambique o Vitor Morgado. E a primeira pergunta que lhe fiz foi: “porque é que te deram a alcunha de “molinhas”? Vítor respondeu-me que isso provavelmente tinha a ver com o estilo desengonçado de ele estar no campo.
É este “molinhas” que hoje não está (fisicamente) connosco. Muitos, principalmente os que privaram com ele no dia a dia, terão conhecido Vítor Morgado melhor do que eu, e por isso mesmo com muito mais propriedade para se lembrarem das suas peripécias. E que não foram poucas. Do tempo de estudante defendendo a Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque na então cidade de Lourenço Marques ou do Atlético, onde o conheci.
Época de 1962/63 – Seleção do Ensino Técnico de L. Marques (EIMA + ECAS)
Em cima: Nelson Serra, Victor Morgado, César Rodrigues, José Pestana, Rui Pronto Silva, Eduardo Horta.
Em baixo: Carlos Pinto, António Brassard, Mota Lopes, H. Bhatt, João Correia Brito Júnior.
Eu morava na Malhangalene, no cruzamento da Rua do Porto com a Rua de Aveiro. E no regresso da João Belo, o pouso certo era sempre o Atlético. Para ver as equipas de juniores e seniores treinarem. Na maior parte dos casos sob a batuta do saudoso Alberto Costa. Até por lá apareceu uma vez um treinador americano.
Lembro-me do Vítor naquela célebre equipa de juniores que de parceria com outros jovens do seu tempo (Zé da Broa, Miá, Faustino, e outros cujos nomes não me recordo agora) levou o Atlético a campeão da cidade, naquela categoria, ainda nos anos 60. Nesse Atlético que era quase pertença da família Morgado. O pai, o velho “montanha” como Presidente do Clube. Os irmãos Acácio, Adriano, Flávio e Camélia, (e depois o Beto) como jogadores. Dificilmente se encontra uma família jogando no mesmo clube. Aconteceu com os Morgados.
Depois veio o Sporting, onde “molinhas” brilhou, ao lado de nomes como os de Mário Albuquerque e Nelson Serra. Depois vieram as selecções nacionais. Vieram noites de emoção e alegria, que eu tentava transportar para os ouvintes do Rádio Clube de Moçambique, naqueles inolvidáveis relatos da GOLO, onde o “saco” era quase palavra de ordem.
Época 1970/71 – Seniores
• Campeão Distrital L. Marques
Em cima: John Hucks, Mário Albuquerque, Sérgio Carvalho, Luis Almeida, Carlos Serra, Victor Morgado e Luis Pina (Treinador).
Em baixo: António Mora Ramos, Fernando Fernandes, Nákios, Nelson Serra, João Romão.
Muito depois, tal como fiz com o Luis Pina, Adam Ribeiro, António Azevedo, Alexandre Franco ou Nuno Narcy, pedi a Vítor Morgado que se sentasse ao meu lado, naquela cabine que nos era reservada, e comentasse um dos jogos da nossa Selecção de Femininos. Vítor comentou. Com mestria e facilidade própria dum bom comunicador, mas acima de tudo com conhecimento, porque afinal o basquetebol era o sangue que lhe corria nas veias.
Victor Morgado, António Azevedo e Nuno Narcy no programa da RM Desporto.
Os elementos que estiveram presentes na “mesa redonda” – Conversas sobre Basquetebol, no programa da RM Desporto de João de Sousa em Abril de 2005 em Maputo.
São eles: Belmiro Simango, Victor Morgado, Nuno Narcy, Samuel Carvalho, Fernando Lima, António Azevedo e à frente do grupo, João de Sousa o moderador do debate.
Nos momentos quentes do jogo entusiasmava-se a tal ponto, que se esquecia do microfone. Criava alguns vazios, próprios de quem não era profissional de rádio. E numa dessas noites, quase na ponta final do jogo, Vítor faz-me um sinal e diz-me em surdina “venho já”.
Saiu da cabine de reportagem e foi colocar-se, como era seu hábito, junto da mesa do júri, mesmo por trás do banco onde se sentam os suplentes, o treinador e o seccionista. Deambulava dum lado para o outro. Dava instruções de fora para dentro. Era o treinador de bancada que tentava empurrar a selecção para a vitória. Acabou o jogo. Ganhámos. A euforia envolveu o “molinhas”. Entrou no campo. Distribuiu abraços e beijinhos. Viveu o momento com a alegria que ele trazia sempre estampada no seu rosto. E no meio dessa euforia, esqueceu-se que tinha de acabar o comentário para a Rádio. Não voltou mais à minha cabine de reportagem. Preferiu comemorar a vitória com as jogadoras e com a sua equipe técnica.
João de Sousa – 02.05.2013
Um Comentário
dadkins
Que lástima que Vitor não jogasse durante os dias do triplo!