O REBUÇADO !
Estolano tinha de finalizar um negócio na passada sexta feira, dia 7 de Fevereiro. Queria comprar um fogão industrial para colocar num restaurante que tenciona abrir no Tchumene, o bairro chique da Matola onde já há mansões de gente graúda da “nomenklatura”, algumas delas equipadas com cozinha americana, cinco quartos todos climatizados com roupeiros e sapateiras, bar, garagem, guarita para guarda, churrasqueira, etc.
Fez os contactos com o seu fornecedor no outro lado do mundo e de lá veio a resposta: “tem 48 horas para comprovar o pagamento por transferência bancária”. Desconseguiu, como se diz por aqui, porque, por força da tolerância de ponto imposta pelo Governo, o Banco não funcionou naquela sexta feira, 7 de Fevereiro, e consequentemente a transferência bancária não se concretizou. Depois veio o sábado e a seguir o domingo. Tudo voltou à normalidade na segunda feira. Já era tarde. O fogão industrial com o qual Estolano sonhava, para equipar o seu restaurante, porque “sai ao preço da China”, foi parar às mãos dum outro comprador. Teve de reiniciar o processo.
A tolerância de ponto na sexta feira, dia 7 de Fevereiro tinha como objetivo permitir que os munícipes pudessem assistir à cerimónia de posse dos Presidentes dos Conselhos Municipais ou Câmaras Municipais, se quiserem.
Um rebuçado do Governo ao “povo deste belo Moçambique” que vem na sequência de outros rebuçados oferecidos pelo executivo de Armando Guebuza, nomeadamente nos dias 2 e 3 de Janeiro do corrente ano. Rebuçados que se destinam a aguçar o apetite dos votantes, para que nas próximas eleições, legislativas e presidenciais, este “maravilhoso povo” saiba como colocar correctamente o X no boletim de voto.
O povo recebeu de braços abertos este rebuçado. Não foi trabalhar. Farrou em homenagem ao edil empossado. Comeu e bebeu nas barracas montadas para o efeito. Misturou a ausência de condições mínimas de higiene com cerveja e galinha assada. Mesmo com chuva dançou ao som da marrabenta ou do pandza, um ritmo popular no País que surgiu na segunda metade de década 2000 e que os entendidos dizem ser uma mistura de “zukuta”, marrabenta, hip-hop e outros ritmos moçambicanos. Quando deu por ela já não tinha quinhenta nenhuma no bolso. O povo lambeu o rebuçado e muito provavelmente até 15 de Outubro, data das eleições para as legislativas e presidenciais, espera por muitos mais. Um rebuçado com sabor a “caça ao voto”. Só que ninguém pode garantir que aqueles que saborearam este rebuçado, vão colocar o X no boletim de voto, a favor do partido do batuque e da massaroca.
Num país como o nosso (pobre, do terceiro mundo, etc…) onde os níveis de produção e produtividade deixam muito a desejar, é impensável que se concedam estas tolerâncias de ponto por “dá cá aquela palha”. O director-executivo da Confederação das Associações Económicas de Moçambique, Kekobad Patel, entrevistado pelo canal televisivo STV, disse que “os feriados e as tolerâncias de ponto excessivos promovem pouco trabalho e contrariam o discurso do Presidente da República Armando Guebuza, que por diversas vezes tem apelado à cultura de trabalho”. Só a tolerância de ponto concedida a 7 de Fevereiro e considerada como sendo “de efeito político” provocou uma perda de 6 milhões de dólares. Recordo-vos que os feriados e tolerâncias de ponto levaram a que, na semana passada, os trabalhadores da Cidade da Matola, tivessem exercido as suas actividades laborais em apenas 2 dias. Na Matola não se trabalhou no dia 3 (Dia dos Heróis), no dia 5 (Dia da Cidade da Matola) e no dia 7 (tolerância de ponto decretada pelo Governo). Caminhar para o desenvolvimento sem trabalhar ? Acho que estamos a fomentar a preguiça, isso sim.
PS: Município de Gurué, antiga Vila Junqueiro, na Zambézia. Uma espinha atravessada na garganta de muito boa gente.
João de Sousa – 12.02.2014