Rafael Maguni … a simplicidade em pessoa!
Rafael Maguni foi meu director na Rádio Moçambique de 1975 a 1980. Quando foi apresentado aos trabalhadores, numa sessão orientada por Jorge Rebelo, na sua qualidade de Secretário da Frelimo para o trabalho ideológico, a primeira frase do seu discurso foi esta: “De rádio pouco ou nada sei. Venho aprender convosco. Não pensem que tenho uma varinha mágica para resolver todos os problemas. Não sou santo milagreiro”.
À primeira vista podia parecer um pronunciamento para impressionar os trabalhadores. Mas não era. A prática de convivência com Maguni mostrou-me que ele vinha para aprender. Era a simplicidade pessoal e profissional.
Um episódio de entre alguns que fomos protagonizando ao longo do tempo ilustra a forma de estar e ser de Rafael Maguni.
Ele pretendia fazer algumas alterações na programação do canal nacional da RM. Pretendia mexer num assunto considerado sensível. Queria estabelecer um critério musical e fazer com que a Rádio Moçambique pudesse iniciar paulatinamente um processo de transmissão de mais música moçambicana. Mas como fazer isso sem provocar um efeito negativo nos produtores dos programas e em especial nos ouvintes?
Convenhamos que não era fácil. E não era fácil porque um dos entraves à prossecução desta sua ideia era encontrar música de qualidade. Maguni sabia que não se podia tocar qualquer música só porque era música moçambicana, como aliás, e infelizmente, é apanágio da nossa rádio pública nos dias que correm. O pouco que havia em matéria de música nossa em 1975 resultava de meia dúzia de discos gravados por algumas editoras locais, como por exemplo a Teal Discos, Casa Bayly, a 1001 ou a Somodiscos.
Rafael Maguni apresentou-me a sua proposta. Na altura eu dirigia o Departamento de Programas. Deu-me uma semana para eu opinar (por escrito) sobre as suas ideias.
“Não penses que és o único a quem estou a solicitar uma opinião. Vou pedir a outros colegas teus“.
Soube posteriormente que Maguni tinha pedido opiniões a vários colegas meus, de entre os quais jornalistas, redactores de programas e até a alguns operadores técnicos.
Raramente (atrevo-me a dizer “nunca”) Rafael Maguni decidia sem consultar. Consultar fazia parte da sua metodologia de trabalho. Um trabalho que se fez sempre em equipe. Uma prática que na nossa Rádio pública (salvo raras e honrosas excepções) bastas vezes é posta de lado. Há exemplos de alguns decisores que ainda actuam ao estilo “quero, posso e mando“.
RM (Rafael Maguni) iniciais do seu nome, que se confundem com o da instituição que ele dirigiu durante 5 anos, agiu sempre no sentido contrário ao da arrogância, da prepotência, do autoritarismo, sem perder no entanto o seu poder de decisão e alto sentido de responsabilidade.
Maguni sempre foi um dirigente de espírito aberto. O político, o gestor, o diplomata (ele foi o primeiro Embaixador de Moçambique no Zimbabwe) e acima de tudo um Homem, pequeno em tamanho, mas grande no seu trato para com o seu semelhante.
Recordo que foi ele que me indigitou para, conjuntamente com Leite de Vasconcelos e o operador técnico Eduardo Pereira, efectuar a reportagem de independência de Angola em Novembro de 1975. Maguni foi o responsável por trazer da Tanzânia o conjunto Afro 70 que participou nas emissões “ao vivo” da Rádio Moçambique na Facim.
Rafael Maguni … a simplicidade em pessoa.
Um exemplo que devia ser seguido por muito boa gente, particularmente por aqueles que ocupam cargos de direcção e gestão e que infelizmente fazem do “poleiro” a rampa de lançamento para usufruto de benefícios pessoais.
PS: Ontem, no quadro das comemorações do quadragésimo aniversário da nossa estação pública de radiodifusão, a Rádio Moçambique homenageou Rafael Maguni.
Antigos companheiros seus, das diferentes áreas de trabalho, lembraram histórias e factos que partilharam com ele no convívio profissional e pessoal.
João de Sousa – 01.07.2015