MOÇAMBIQUE DE 1491 A 1974 – 4 ETAPAS DA SUA HISTÓRIA
Por Cândido Azevedo
Hoje publicamos o 2º dos pequenos textos, sobre a História da nossa querida terra, Moçambique, desde que os portugueses ouviram dela falar. Conforme já referido estes textos pertencem ao livro editado em 2020 e intitulado “PELAS MALHAS DO ANTIGO IMPÉRIO. HERÓIS E VILÕES: CORAGEM, DIVERSIDADE, PECADOS E TRAIÇÕES”, do Cândido Azevedo, alguém que viveu a sua infância na Índia e a juventude em Lourenço Marques.
- A CAPITANIA DE MOÇAMBIQUE
Vasco da Gama, ainda em 1498, chegará à Ilha de Moçambique, nome do sultão local Mussa Bin Mbike (Moisés filho de Mbiki) traficante de escravos. A pequena ilha, com cerca de 3 km de comprimento e 400 m de largura, tinha uma longa rede comercial com o Oriente. Inicialmente bem recebido, dão os ilhéus conta de não serem os recém-chegados crentes do Islão, pelo que vão criar graves problemas.
Álvares Cabral também a visitará em Fevereiro de 1501 no seu regresso da Índia. Importante como ponto estratégico, a ilha torna-se escala forçada, pois passara a ser o local de encontro das naus perdidas da Carreira da Índia e porto de abrigo das que se atrasassem e perdessem a monção.
Portugal ocupa-a em 1507 por aquisição tácita e incorpora-a no Estado da Índia. Entretanto em Sofala, devido à presença portuguesa, os árabes desviam as rotas do ouro. A partir de 1535, o fim do comércio do ouro leva à perda da importância de Sofala a favor da ilha, que se torna na capital política e residência dos Capitães, mantendo a sua subordinação ao Vice-rei na Índia. Fora da Ilha, entre 1530 e 1544, mercadores apoiados por pequenos exércitos privados, fundam novas povoações como Quelimane, Sena, Inhambane e Tete. Por aqui, todos eles feitores, marinheiros, soldados e até padres, foram comerciantes de escravos e só acessoriamente cumpriam as suas obrigações. Bem posicionada para atender ao comércio do vale do Zambeze, a Ilha tornar-se-á importante entreposto comercial de ouro, marfim, panos, pau-preto e escravos. A insistência dos árabes na reocupação da Ilha leva os portugueses a iniciar em 1558 a construção da Fortaleza de São Sebastião que será a maior da África Austral.
Esta, passados uns anos, terá na sua traseira um campo de fuzilamento. A ambição pelo ouro mantinha-se pelo que não é de estranhar a chegada em 1571 da expedição comandada por Francisco Barreto com o título de “Capitão-General de Moçambique e Sofala e Rios de Cuama e Conquistador das Minas de Monomotapa, título que se quedou apenas no papel, pois nunca conseguiu chegar às minas. Nos inícios de 1600, a fortaleza repelirá por três vezes, os cercos dos holandeses (cont.).
Sabia que …
- A frota de Vasco da Gama usou aqui pela primeira vez os seus canhões, para dispersar uma multidão de ilhéus, todos muçulmanos, que cercando um poço, quis impedir o abastecimento de água à armada?
- Embora sendo a ilha baixa, alagadiça e insalubre, dizendo-se mesmo que poucas cidades haveria no “reino de cincoenta anos a esta parte que enterrassem em si tanto defunto como ela tem dos nossos”, a parte próxima da fortaleza com as suas ruas, igrejas, casas e confrarias religiosas rapidamente se tornou numa cidade europeia, enquanto na parte sul, manteve-se a cidade de macuti (com os telhados das tradicionais folhas de coqueiro) de matriz suaíli?
- O campo de fuzilamento, por trás de um dos vértices da fortaleza, foi um mal que se justificou porque a quase totalidade dos homens que serviam na África Oriental era constituída por degredados e compelidos, pouco habituados à disciplina, chegando aqui a haver revoluções contra os governadores e seus comandantes?
- Um macua moçambicano chamado Yasufe, trazido pelos portugueses desta Capitania para o Oriente, vai em 1579 para o Japão com uma delegação de jesuítas, onde despertou tamanha curiosidade que Nobunaga, o grande daimio, ganhou por ele tanto espanto como admiração, que o fez nobre e samurai?
NOTA DO AUTOR:
No período negro da pandemia, decidi desafligir pela escrita. Lembrei-me então de ser eu filho de um Império já desaparecido e que, enquanto aprendiz de historiador, procuro percorrer há mais de quarenta anos cada um dos seus territórios e são eles mais de cem, como que a recolher os ossos desse já “morto Império”, como lhe chamou Eduardo Lourenço. Para o efeito retirei do baú textos já anotados e pesquisados há muito, alinhavados anos atrás quando semanalmente participava na rádio, com a rubrica Arquivos da História, da responsabilidade da Fundação Rui Cunha. Notas retiradas de enormes e pesados compêndios e enciclopédias, de obras de autores de renome, de recentes teses académicas ou ainda de registos de muitas dezenas e dezenas de visitas a esse antigo “Luso mundo” e seus arquivos. Aligeirei tais textos mantendo o sentido dos seus conteúdos, procurando estimular a curiosidade do leitor pela nossa aventura oceânica, para que ajuízem da dimensão do feito e se orgulhem da alma imensa de um povo minúsculo capaz de sonhos maiúsculos e de os realizar. Sim, enfrentámos o incógnito, o estranho, o distante e diferente e não nos deixámos dominar por medos e receios. Ao invés, tivemos a coragem e a ousadia de ir sempre mais longe, muitas vezes por enviesados caminhos, mas com a lucidez de nos misturarmos e miscigenarmos com o Outro. Falo assim de um império construído pelo esforço e coragem de muitos heróis, contrapondo as traições, a pirataria e actos incompassivos de outros portugueses. Referi-me às variadas formas que os condicionalismos da História o permitiram.
Cândido Azevedo
Agradecemos as imagens de:
https://www.wikiwand.com/pt/Fortaleza_de_S%C3%A3o_Sebasti%C3%A3o
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/1d/1598_Mosambique_Kaerius.jpg
https://fotos.web.sapo.io/i/o2911f31f/14589678_BzRYg.jpeg
https://as-maravilhas-portuguesas-espalhadas-pelo-mundo.webnode.pt/a7%C2%BA/
- NOTA: Quem estiver interessado em adquirir o livro intitulado “PELAS MALHAS DO ANTIGO IMPÉRIO. HERÓIS E VILÕES: CORAGEM, DIVERSIDADE, PECADOS E TRAIÇÕES”. Pode contactar o autor através do seguinte email: ccarmoazevedo@yahoo.com
3 Comentários
Cândido Ramiro Filomeno do Carmo Azevedo
Obrigado dulce. A nossa terra está sempree presente. Beijinho
Zé Carlos
Caro Cândido Azevedo,
Pelas amostras até agora publicadas e por mim bem apreciadas e digeridas, estou convencido que és homem com muito talento e muita paciência para estas coisas.
Saber contar a história simplesmente como um observador sem se subir ao pedestal do conquistador ou lembrada como perdedores não é muito fácil, e no caso de eventos corridors à séculos atrás, muito mais dificíl.
No teu caso noto que é bem demonstrado o bom senso, perspicácia e balanço objectivo por ti conseguido.
Infelizmente, as grandes voltas que se fizeram e conhecimentos e sabedorias conseguidas ao longo dos tempos, plo menos no âmbito da era e até aonde se chegou como nação império… fico com a impressão que os DDT ao longo do caminho, muitas vezes deixaram-se engordar perderam-se na sua obrigação que tinham e teêm no contrato do destino conjunto… E hoje em dia, práticamente regressamos ao ponto (talvez antes) da partida.
Aguardo com antecipação os teus próximos molha bicos.
Dulce Gouveia
Cândido, é com prazer e curiosidade que leio os teus textos.
A nossa história é tão rica e variada que estamos sempre a aprender.
Chegámos a ser o maior império do mundo, com uma população tão pequena e……acabámos reduzidos a isto……
Kanimambo!
Abraço