Bem-vindo à Matola!
Passados todos estes anos desde 1975, porquê a Matola?
Porque:
– Muitos leitores do BigSlam que residiram em Moçambique, mas não em Lourenço Marques! Não a conhecem.
– Dos que a conhecem, muitos não conhecem a sua história.
– Os ex-residentes na diáspora estão ansiosos por recordar os tempos que lá viveram.
E eu porque recordo com saudade a “divisão dos frangos à cafreal”, no restaurante Kassimatis.
Por tudo isto, decidi publicar este artigo.
Do que pesquisei nem tudo são novidades, para mim!
“É a segunda cidade moçambicana. O seu nome provém de Matsolo. Um povo bantu que entre os séculos II e IV se fixou na área do actual município, junto a um pequeno rio que desagua na baía de Maputo. O seu domínio era bastante extenso, incluindo uma área que ia até à Namaacha.
Em 1895 a área da Matola é incluída na 1ª Circunscrição Civil de Marracuene no então Distrito de Lourenço Marques, quando Moçambique era colónia portuguesa.
A povoação foi criada pela portaria nº 928 de 12 de Outubro de 1918. Mas uma portaria de 20 de Abril de 1968 determinou que a então Vila da Matola se passasse a denominar “Vila Salazar”.
Devido ao seu dinamismo económico e demográfico, esta Vila tornou-se na maior zona industrial de Moçambique. E ali se estabeleceram as fábricas de cimento, a CIM, o complexo mineiro dos CFM, a Shell Company e a Caltex.
O crescimento do fluxo diário de pessoas com a cidade de Lourenço Marques levou, no início da década dos 70, a indústria expandir-se para a Machava. E implantaram-se os novos bairros do Fomento e o da Liberdade.
Através de uma portaria de 5 de Fevereiro de 1972, a vila ascende a cidade, passando a chamar-se “Cidade Salazar”. No ano seguinte, implantam-se novos bairros na Machava e regista-se um significativo aumento da densidade populacional em áreas que até aí tinham características rurais.
Com a independência do país, a 25 de junho de 1975 recupera o nome original, passando a denominar-se, “Cidade da Matola”. E de 1980 até 1988 a fazer parte do “Grande Maputo”.
Hoje é um município, capital da província de Maputo e é também um distrito; uma unidade administrativa local do Estado central moçambicano criada em 2013. E que coincide geograficamente com o município…
Tem a área de 373 km2, e uma população em 2017, de cerca de 1,1 milhões de habitantes. Tornando-se na segunda maior cidade moçambicana, depois de Maputo. O município está dividido em três postos administrativos: Matola-Sede, Machava e Infulene.
Tem limite a noroeste e a norte com o distrito de Moamba a oeste e sudoeste com o distrito de Boane, a sul e a leste com a cidade de Maputo e a nordeste com o distrito de Marracuene. Fonte: Wikipédia
A Matola que conheci.
É verdade que pela sua extensão, e tirando algumas visitas que ali fazia aos meus amigos, não a conheci muito bem!
Na minha juventude pouco me importava se era vila ou cidade! – Era simplesmente a Matola.
Por estar “paredes meias” com a capital, recordo-a como um dormitório. Em que as principais ruas ainda eram de terra batida. E depois, juntamente com a vizinha povoação da Machava passou a ser a principal zona industrial de Moçambique.
Era ponto de passagem obrigatória na saída de Lourenço Marques para as povoações de Boane, Ponta do Ouro, Goba, Namaacha e Ressano Garcia nas idas para a África do Sul. E para muitos de nós, foi durante 3 meses o “caminho” quase diário para Boane! No cumprimento do serviço militar.
E não estou a errar, se vos disser que não há ninguém que tenha residido em Lourenço Marques, ou resida em Maputo que não conheça, mesmo só de passagem, a Matola. E até muitas das vivendas térreas ali existentes, foram construídas na época colonial pelos próprios moradores num espírito de inter-ajuda, com familiares e amigos.
Algumas vezes com um grupo de amigos, para “mudarmos de ares e fugir à rotina da capital”, nas noites de sábado íamos a esta vila/cidade ao cinema S. Gabriel.
Ou então ao restaurante Kassimatis na Matola-Rio, comer os seus afamados pregos e “mariscar camarões e caranguejos”. Que nada “ficavam a dever” aos que nos eram servidos no restaurante da Costa do Sol!
Durante os dias da semana os maiores clientes deste restaurante eram camionistas, turistas sul-africanos e militares de, e para Boane.
Com saudade recordo aquele princípio de noite fria em que, sem ser previamente combinado, resolvemos jantar nesse restaurante! E tivemos de fazer o que Cristo fez com o “Milagre da multiplicação dos pães”. Com poucos pães matou a fome a uma multidão!
Também nós, depois de fazermos a contabilidade, com poucos escudos, sobrantes do pré da recruta militar, tivemos de praticar o “Milagre da divisão dos frangos”. Cada frango à cafreal (a 41 escudos, cerca de 0,21€) foi dividido por três! E para o estômago não ficar com muitos espaços vazios à espera do “mata-bicho” do dia seguinte, valeu-nos o pão e as batatas fritas. Que não tiveram descanso!
No fim do jantar (?) à saída da Matola para Lourenço Marques, desde o cruzamento da Machava-estação até à central da Sonefe, o fumo, o cacimbo ou o nevoeiro… ou tudo junto! Eram de tal forma “cerrados” que não se via “um palmo à frente do nariz”. A solução foi o Vicente (agora meu cunhado) sair do automóvel, e guiando-se pela faixa branca pintada na berma do alcatrão, dar-me indicações por onde devia seguir, para não sair da estrada… e não fomos os únicos a adoptar este processo! Também outros em sentido contrário o estavam a utilizar.
Algumas vezes naquela zona, e junto à estação agrária do Umbeluzi, nas noites da ida para Boane, também apanhei nevoeiro. Mas nunca nenhum como este!
Hoje a Matola, pelo enorme crescimento populacional económico e industrial é uma cidade “moderna” que não pára de crescer. E está ligada à capital por uma via rápida que, como consequência dos “novos tempos”, também tem portagens!
Pela sua densidade populacional e dinamismo, em Novembro de 1996 os municípios de Loures, e em 2019 o de Faro assinaram um protocolo de geminação e um acordo de cooperação com esta cidade. Com o fundamento no uso comum da língua portuguesa.
- Porque muitos dos seus ex-residentes e actuais residentes têm casos e acontecimentos, aqui passados, para contar! Para ficarmos a conhecer melhor a Matola podem contá-los aqui, num breve comentário.
Para nós com o BigSlam, o mundo já é pequeno… Muito pequeno!
João Santos Costa – Março de 2022
16 Comentários
Batista
Boas Tardes.
Apenas para dizer que foi nas tardes dançantes ao ritmo do então conjunto musical “Muchachos Del Ritmo”
no “Kassimatis” que conheci uma linda menina que no Ano de 1969 casei com ela. Belos tempos.
Luiz Vilas
João, obrigado pelo excelente artigo. Guardo muito boas e belas recordações da Matola.
Foi muito bom recordar esses tempos. Gostaria de lembrar, também, os bailes no clube da Matola e as “provas de motorizadas”, nas quais o meu irmão competia numa motorizada
“vitoria avanti” em representação da firma Gonçalves e Irmão.
Zé Carlos
As minhas recordações da Matola resumem-se ao seguinte;
A fábrica de bolachas da Matola que organizava aos fim de semana, eventos de promoção com a participação de miúdos em concursos no auditório do Radio Clube e no Cinema Nacional, e no fim eram oferecidos vários prémios. A mascote chamava-se “O Matolinha” e era a uma das figuras maiores do entretimento.
Anos antes desses tempos, os meus Pais tinham investido em dois terrenos, um tinha sido adquirido nos finais da década de ’40 em sociedade com um fulano, o meu Pai era ainda solteiro, e o outro terreno foi comprado já depois de estar casado em fins dos anos ’50.
Tudo isso adquirido à custa do trabalho e poupancas, para deixar ficar alguma herança aos filhos.
O primeiro terreno tinha várias cajueiros, mangueiras, uma abacateira e uns limoeiros.
O segundo terreno era perto da Camara Municipal e tinha umas goiabeiras, laranjeiras, gingiveira e umas papaeiras.
Tinhamos o ritual de ir aos terrenos nas alturas certas para apanhar as frutas que iam ficando maduras.
A minha Avó e Mãe, todos os anos faziam goiabada e jam de laranja que eram preservados em frascos para o ano todo.
Lembro-me bem de andar apanhar o cajú pendurado no fundo da fruta vermelha, que eu gostava de comer mas tinha um sabôr esquesito e a qual o meu Avô aproveitava para fazer um licor. Os cajús eram assados em cinzas quentes e depois descados, tarefa em que todos eram mobilizados para despachar rápido, porque dava uma grande trabalheira.
No fim deu-se a reviravolta, fomos para a “Metróple” em fins de ’76 práticamente com as mãos abanar e a Frelimo ficou com aquilo tudo, incluindo a nossa casa na J. Serrão com a grande parte do recheio porque não dava para levar tudo.
Chegámos a Portugal como muitos outros sem saber como ia ser o futuro, mas sem medo de enfrentar uma nova realidade e com vontade de lutar para recomeçar uma vida nova práticamente do zero.
Do meu conhecimento, até hoje o governo Português, lavou as mãos e nunca quis saber de compensações etc etc…
A atitude dos sucessivos governos, p’lo menos do meu ponto de vista, está dominada pela retórica esquerdista e históricamente tem abafado a verdade.
Manuel Martins Terra
Gratas as recordações da Matola, localidade que contemplava-mos nas passagens para Boane, Umbeluzi e Namaacha. A 10 Km, da capital afirmava-se já na época, como uma terra promissora, que ganhou maior dimensão considerável com a criação da zona Industrial, a maior de Moçambique. Quem já não se lembra do imponente edifício da Companhia Industrial da Matola, equipada com tecnologia de ponta ,do melhor que havia a nível mundial, onde se fabricavam as deliciosas bolachas Polana e as massas alimentares Ceres, No plano social a CIM, dispunha de refeitórios para os seus trabalhadores, biblioteca e um salão de festas,para além de moradias para os seus colaboradores. Mereciam também destaque a Refinaria da Sonarep, a Fabrica da Tudor, a Quimica Geral, a Companhia de Cimentos, a Shell, as Fábricas de Tintas Cin e Pintex, a Caven, Industrias Costas e muitas mais de grande envergadura. A Matola, foi crecendo e passe a expressão tornou-se Matulona, qualificando-se cidade dormitória que alberga mais de 1 milhão de habitantes. Obrigado, João, por este teu postal memorial , que nos vai ajudando a reelembrar tempos de sonho. Um abraço, do amigo Manel..
Eduardo Horta
Amigo João, tarde, mas apereci! Seria difícil nada dizer sobre a Matola, onde tive além de familiares vários amigos que aí viviam. Muitas vezes fui para a Matola, quer de carro, moto ou Barco pois o meu pai chegou a ter, não tanto , uma marina, mas mais um ancoradouro de barcos de recreio, na sua totalidade veleiros, dos quais por curiosidade dois deles tinham dado a volta ao mundo. Quer pela quantidade, quer pelas dimensões, não tinham nem lugar nem condições à época, nem no Clube Naval, nem no Clube de Pesca. Sendo a maioria, de proprietários Sul-Africanos era o local mais perto do mar para todos os que viviam no Transvaal, muitos deles amigos e conhecidos das competições de vela. Era uma zona do rio Matola que tinha uma área concessionada em terra para apoio. Além disto,desde da minha saída do serviço militar, leccionei na Escola Preparatória da Matola 7 a 8 anos, quase desde a sua inauguração. Resumindo, conheci bem a Matola. Parabéns João pela crónica. Um abraço.
Ernesto Maia
Bonito!
E a escola primaria, onde eu andei, era fantastica (cheia de cor)
António Pinto Mendes
Excelente relato sobre a “nossa” Matola – agora que falaste nisso, caro João, lembro-me do nome que lhe foi posto de Vila Salazar, mas que na verdade nunca pegou: a Matola foi sempre Matola! – a sua história e os seus lugares mais característicos. A propósito da sua história, recomendo vivamente a todos os interessados o livro “Moçambique, feitiços, cobras e lagartos – Crónicas romanceadas” de João Craveirinha (sobrinho do poeta Josè Craveirinha) da Texto Editora. Nele podemos aprender imensas coisas da História de Moçambique e compreender melhor tudo o que se passou durante o período colonial português.
É sempre bom aprendermos! Bem hajas pelas tuas crónicas.
Abraços
Maria Fernanda Raposo
Embora tivesse vivido sempre em L.Marques, conheci bem a Matola por lá terem vivido familiares e amigos. Era uma vila bastante simpática e, já nessa altura, em franco crescimento, não se comparando, no entanto, ao seu estado actual, mas também já passaram 40 anos!!!
Gostei imenso do seu artigo e fiquei a saber algumas coisas que desconhecia, obrigada!
Luisa
Gostei muito de ver. Estive em LM desde1948 até 1975. Não fazia a mais pequena ideia
Sonia Possolo
Gostei muito de ler este artigo e confesso que ignorava muito do seu conteudo. Saí de Lourenco Marques para Portugal em 1968, depois de ter trabalhado 7 anos nos escritorios da Companhia Industrial da Matola, na Ŕ. Consiglieri Pedroso em LM. Da Matola propriamente dita, desse tempo, conhecia algumas vivendas de amigos e o rrestaurante/dancing da Matola-Rio. Nunca imaginei que hoje fosse a segunda cidade de Mocambique!
Jose Antonio oliveira Zé Tó
Obrigado, não me recordo de alguma vez chamar Salazar a Matola. Recordo de irmos passear a Matola as casas eram baixas de linhas simples, tudo muito arrumadinho. Íamos visitar o Sr Matoso e a esposa, um casal amigo dos meus pais. Ele funcionário do BNU, casal muito simpático. Obrigado
Jorge Madeira Mendes
No dia 25 de abril de 1959 (tinha eu completado 6 anos de idade três semanas antes), a firma onde o meu pai trabalhava (Dionísio & Almeida, de LM) realizou o seu almoço de confraternização anual no restaurante Matola-Rio, também conhecido como Kassimatis.
josé carlos alves da silva
Os meus Pais falava muito sobre a Matola, Boane (militares), Machava, Ressano Garcia e já estou na África do Sul. Mas quando falavam nestas terras-cidades-vilas os olhos deles brilhavam. Machava só o estádio de futebol ( que grandeza meu Deus) e o meu Ferroviário a ganhar, que bom ( Baltazar & Ca Lda), o resto era LM. Mas Quelimane sempre. O Amigo e João Costa descreveu por etapas a Matola ( Vila Salazar, Cidade Salazar e agora Cidade da Matola), os Bairos do Fomento, a Cª de cimentos, etc… tudo descrito duma maneira tão pormenorizadas, quem está a ler como eu, parece que estamos a passear por estas localidades lindissímas. Parabéns Amigo João, por relembrares épocas passadas, que jamais regressam, fica a nostalgia. Além das localidades que nunca mais eu as revi pessoalmente, também nunca mais revi os meus colegas, amigos, conhecidos e povo moçambicano que diáriamente os cumprimentava. Obg João
Milu Gouveia
Gostei de conhecer a historia da nossa Matola , sempre a aprendermos, obrigada.
academica69@yahoo.com
João, grato pela cronica de mais uma memória do nosso inesquecível e belo historial. Abraço
Elaine Vilaca Tomas
Matola, passei la os melhores anos da minha vida.