DEMISSÃO DE RICARDO COSTA
Meu artigo de opinião saído no Público (11/06/2014):
Portugal tem atravessado crises realmente más, mas nelas nunca nos faltaram nem homens, nem dinheiro ou crédito. Hoje crédito não temos, dinheiro também não – pelo menos o Estado não tem – e os homens não os há, ou os raros que há são postos na sombra pela Política. De sorte que esta crise me pareça a pior – e sem cura” (Eça de Queiroz, 1845-1900).
Este meu artigo encontra fundamento, apenas, no facto de ser leitor de Ricardo Costa no Expresso. Não significa, portanto, que eu seja influenciado por conhecimento pessoal: não sou figura pública da política ou do jornalismo, das belas-letras ou das belas-artes, ou, mesmo, do quer que seja.
E sinto-me feliz por isso face a determinadas figuras públicas da política que fazem a infelicidade de uma sacrificada classe média, quase em estado comatoso, a quem são exigidos deveres e sonegados direitos.
Malgré tout, nunca me passaria pela cabeça a indelicadeza de me servir desta oportunidade para, por hipótese, me referir em desabono político de António Costa, actual presidente da Câmara Municipal de Lisboa, candidato à presidência do Partido Socialista, sobre quem recaem , uma vez mais, os holofotes da imprensa, da rádio, da televisão e de simples politólogos de tertúlia de café.
Apesar de aposentado, não me resigno em ver passar o tempo. De quando em vez, “diletante de coxia”, como diria Eça, entretenho os meus dias de saudade da docência com escritos de posts em blogues que têm a utilidade de me dar o feedback do que vou escrevendo não fugindo à polémica, embora tendo sempre presente o princípio de Fialho de Almeida: “A luta é legítima. Eu não respeito as suas ideias – respeito-o a si”.
Pela referência que fiz a blogues, não posso deixar de me reportar a certos comentários sob anonimato que fariam corar de vergonha a juventude de ontem, mas não grande parte da actual viciada no palavrão, a ponto de eu pensar que o palavrão quase se tornou o calão de tempos passados. Isto sem querer passar paninhos quentes sobre certa linguagem nada vernácula d’outrora, redigida por destacados nomes da polémica jornalística. Colho exemplo na caneta verrinosa de Francisco Homem Cristo (1860-1943), fundador do jornal Povo de Aveiro, havido por Guerra Junqueiro como “brutamontes com ideias”.
Acerca deste jornalista, foi escrito por Barradas de Oliveira que, aconselhado pelo filho a dar ao jornal uma orientação mais doutrinária e menos polémica, viu a sua tiragem descer. Voltou à polémica e respondeu ao filho: “Qual doutrina! O que eles querem é porrada!”
Como é do conhecimento público, encontram-se os irmãos Ricardo e António Costa em actividades profissionais diferentes.
Este facto levou aquele jornalista, para não ser alvo de suspeitas de falta de isenção em nome de laços de família, a pedir a demissão de director do Expresso, declinada de imediato pela respectiva administração. Nada disto aconteceria se, pelo contrário, estivéssemos em presença de dois irmãos que “eram piores que inimigos – eram irmãos”, como escreveu, com o habitual humor cáustico, Dino Segre ( pseudónimo de Pitigrilli por, ainda segundo ele, “gostar de pôr os pontos nos ii”).
Por vezes, em conversas, sobre determinados aspectos da vida política portuguesa, eu, que me assumo de direita (não aquela direita ditatorial que não respeita os direitos dos cidadãos), dou comigo e alguns dos meus interlocutores de esquerda não radical, surpreendidos, verdadeiramente surpreendidos, a exclamar: “Você é que parece de esquerda e nós de direita, ou vice-versa”!
Ao que chegou o desencanto pelos partidos políticos desrespeitadores dos seus compromissos eleitorais! Se vivesse hoje, teria razão Eça em se mostrar tanto ou mais cáustico e desiludido com deputados que, segundo ele, “’perpetuamente’ discutem quem há-de organizar o País ‘definitivamente’”? Aliás, esta pecha de afirmar que é definitivo (sinónimo de irrevogável) o que deixa de o ser, de um dia para o outro, continua a fazer escola na actual política portuguesa!