Os colonialistas
Por João Santos Costa
Não é novidade para ninguém que Portugal foi um império colonial. Não com a crueldade de outros países europeus, que impuseram aos naturais das suas colónias políticas segregacionistas de “apartheid”, escravatura e outras!
Para que a memória não esqueça, vale a pena referir que com o consentimento dos líderes mundiais, porque sabendo o que se estava a passar com a colonização belga no Congo (Zaire), onde o rei Leopoldo II permitiu que se cometessem toda a espécie de atrocidades e chacinas, e esses líderes fizeram “vista grossa”!
As passagens transcritas a seguir envergonham o chamado “mundo civilizado”:
“.….Muitos aventureiros de toda a Europa foram para o Congo, nessa época, atraídos pelo dinheiro fácil conseguido através da venda de escravos. Outros invadiam as aldeias que resistiam ao trabalho de extração da borracha e, para cada bala disparada, tinham que apresentar a um oficial belga a mão direita do africano morto, para só assim receberem o pagamento………… Um oficial belga exibe, orgulhoso, o seu “jardim de crânios”, que consistia em uma cerca ao redor de sua casa, toda construída com cabeças africanas decepadas, numa clara intenção de intimidar os que, porventura, ousassem desobedecer as ordens de Sua Majestade………… Para se ter uma ideia de tanta desumanidade, basta observar o que disse um oficial, conhecido por Fiévez, tentando justificar a chacina de cem pessoas, quando estas não conseguiram fornecer aos seus soldados o peixe e a mandioca exigidos: “Eu fazia guerra contra eles. Um exemplo bastava: cem cabeças cortadas fora e a estação voltava a ser abastecida com fartura. Meu objetivo final é humanitário. Eu mato cem pessoas […] mas isso permite que outras quinhentas vivam”. Como afirmou Edmund Morel, uma das maiores vozes que ecoaram contra o trabalho escravo dos africanos, “o Congo é uma sociedade secreta de assassinos, tendo um rei como cabeça…….”
Passagens do livro “ O Fantasma do Rei Leopoldo” de Adam Hochschild
Foram estes e outros países, que em organismos internacionais acusaram Portugal de utilizar “métodos bárbaros” contra os povos indígenas por si colonizados?… “É preciso ter lata, mesmo muita lata!”
O colonialismo português apoiava-se mais em algumas trocas comerciais, na exploração de terras aráveis do homem pelo homem, e nas restrições dos direitos e liberdade desses povos. Não há memória de ter cometido nada parecido com estas chacinas e barbáries!
A partir dos anos cinquenta do século passado, começou a despontar nas colónias portuguesas uma pequena elite de africanos, e as condições de vida desses povos começaram lentamente a mudar! Embora não de todo; porque como consequência do colonialismo, os brancos possuíam habilitações académicas e formação superior às dos não brancos. Isso permitia-lhes continuar a dirigir os serviços públicos e gerir outros. Assim como, ao fixarem-se à terra criarem os seus negócios movimentando a pequena economia.
Ao contrário outros houve, e há! Os grupos económicos dirigidos do exterior que, pela cobiça das matérias primas, em conluio com alguns políticos africanos, delapidavam o(s) país(es) e dominavam/dominam a seu bel-prazer a economia, limitando assim as condições de vida dos povos.….Estes grupos que “sacavam” (sacam), e mandavam as riquezas para o exterior e que usavam (usam) o “colonialismo de exploração” a troco de uma côdea de pão, é que eram (são) os verdadeiros “colonialistas” ou se quiserem “neo-colonialistas”.
Será que também fui “Colonialista”?
Nunca me considerei como tal! Mas quando aqui cheguei a Portugal, em 1975, os partidos de uma certa esquerda me baptizaram de “colonialista”; fiquei a pensar porquê?
Teria sido por:
– Ser branco, ter vivido em África e chegado pobre a este país?
– Nas escolas e emprego ter tido colegas, amigos de carteira e brincadeira “brancos, pretos, amarelos e outros”, e não ligávamos nem nos preocupávamos com isso do racismo e colonialismo? “Isso” era coisa dos políticos!
A única passagem da minha vida em que me poderia ter relacionado com os “Colonialistas” foi por na Associação dos Velhos Colonos em Lourenço Marques, ter frequentado a piscina, as tardes dançantes e jogado matraquilhos com outros miúdos.
Mas será que isto lhes deu o direito de me chamarem “colonialista”? – Julgo que não!
Para mim, tenho como dado adquirido que me baptizaram “assim” porque souberam que eu
Tive uma fazenda em África1 ”
Foi em Moçambique. Só foi minha até ao princípio de 1975. Ainda hoje passados mais de 41 anos, me tira horas de sono ao recordar com saudade o tempo que lá vivi!
Tinha uma extensão muito grande! Quando a queria percorrer não podia ser a pé.
Era delimitada a norte pela Costa do Sol, Mahotas e Infulene. A sul e este: por uma baía chamada do Espírito Santo, com praia e uma marginal donde dava gosto ver o pôr do sol.
A oeste pelas lindas vilas da Matola e Machava.
Nunca tive o trabalho de plantar árvores de frutos. – Os cajueiros, coqueiros, as mangueiras, bananeiras, papaieiras, e… outras, eram uma dádiva da natureza!Ah, mas o seu feitiço estava no interior: – Avenidas com edifícios modernos; passeios largos com acácias; praças e jardins floridos e tratados; tudo geometricamente desenhado. Tinha um movimento que causava inveja em toda a África.
Também tenho de vos dizer que aquela “fazenda” não era só minha! Era de centenas de milhares de moçambicanos e “luso- moçambicanos”. E todos os dias cultivávamos a amizade, o respeito e a fraternidade. Era por isto que os que ali viveram e vivem tinham/têm perante o mundo, uma postura de vida diferente!
Não precisei de a baptizar. Quando a herdei, outros já lhes tinham posto os nomes de: – Baía da Lagoa (Delagoa Bay), Xilunguíne, Cidade das Acácias, Pérola do Índico, ou se quiserem, simplesmente Lourenço Marques.
A todos os moçambicanos, angolanos e outros, muitos meus colegas de escola, trabalho e desporto quero vos dizer que, como eu, as centenas de milhar de “luso-africanos” que em Angola e Moçambique nos fixámos, fomos forçados a sair porque a situação político/militar a partir de 25abril 742 se alterou; e nos trágicos acontecimentos de 7setembro742 ninguém nos garantiu a segurança mínima! Nós, que alguns de vocês fazendo coro com os partidos de uma certa esquerda, ainda hoje por troça, teimam em nos alcunhar de “colonialistas retornados” nada temos de comparável com os verdadeiros colonialistas. Não colonizámos, não roubámos nem delapidámos o país, porque por adopção também era nosso. E em nada contribuímos para a crise económica, social e política que vocês ainda hoje vivem. Essas responsabilidades têm de ser pedidas a outros, e não a nós!
Porque este artigo não é nenhum tema tabu e se por emoção e tristeza,
…. tu sorriste e sussurraste, sou da mesma terra que tu ”!!
Poema da Ana Paula Lavado e a voz do Rui Moniz. Realização Anabela Pereira.
- (1) – Karen Blixen em “África Minha”
- (2) – Já aqui referidos no meu artigo “ em LMarques há 42 anos o galo amanheceu”
Para nós com o BigSlam o mundo já é pequeno!
João Santos Costa – Outubro de 2016
5 Comentários
Fernando Alves
Gandhi dizia que o problema não eram as pessoas, mas sim o sistema…
João Costa
Eu juntava as duas: O problema são algumas pessoas e o sistema. Obrigado pelo seu comentário, Fernando. Um abraço.
Isabel Ribeiro dos Santos
Não vos conheço mas sou também Moçambicana de coração. Nunca ninguém que não viveu lá vai alguma vez imaginar o que é viver num clima saudável de fraternidade, amor e paixão. Cresci em Moçambique andei na escola desde Porto Amélia até Lourenço Marques passando por Nampula e João Belo (Xai -Xai ) e os meus amigos e colegas eram de todas as raças sem distinção. A vida, o clima, os cheiros, o sol, o ar livre proporcionaram a todos uma vida saudável quer física quer mental. Adoro Moçambique de onde saí em 1976 e não quero morrer sem lá voltar.
Um abraço
João Costa
Obrigado pelo seu comentário, Isabel. Também é minha opinião que todos que estivemos em África adoramos África! Queira Deus que volte lá tão breve quanto possível.
Admin
Para quem não saiba, a Isabel Ribeiro dos Santos foi uma excelente atleta do basquetebol moçambicano (Académica LM) e mais tarde do basquete nacional português. É Prof. de Educação Física e uma treinadora de grande nível. As suas três filhas seguiram as pegadas dos pais e qualquer delas se notabilizou na sua modalidade de eleição – O BASQUETEBOL!!!