“UMA DATA NA HISTÓRIA” – 20 de Março de 1922… Reinaldo Ferreira
Um homem de cultura com algumas facetas criativas: o de escrever letras de canções, sobejamente divulgadas pela Rádio, algumas delas cantadas por João Maria Tudela, como foram os casos de ”Uma Casa Portuguesa”, “Piripiri” “Magaíça” ou “Khanimambo”, e de escrever poesia e textos para teatro de radiofónico e de revista. No então Rádio Clube de Moçambique, foi responsável, durante alguns anos, da Secção de Teatro.
Chegou a Lourenço Marques, com 19 anos de idade, vindo de Barcelona. Aqui concluiu o 7.º ano do liceu. Foi funcionário público. Embora vivendo profundamente a maneira de estar e de ser do lourenço-marquino, era, como disse um dia o jornalista, escritor e seu amigo pessoal Guilherme José de Melo “um europeu pelo nascimento, pela cultura, pela mentalidade”.
E assim permaneceu Reinaldo Ferreira até 30 de Junho de 1959, altura em que um cancro no pulmão fez com que ele nos deixasse fisicamente.

Número Especial do jornal Notícias de Moçambique, referente ao Natal do ano de 1959, na página 60.
O jornalista Nuno Pacheco chegou a escrever no jornal “Público” que “a obra de Reinaldo Ferreira foi breve, mas de tal modo forte que levou a que o comparassem a António Nobre ou Fernando Pessoa”.
Os seus poemas, divulgados em jornais e revistas, só foram publicados em livro depois da sua morte, por iniciativa de alguns amigos seus, em Moçambique pela Imprensa Nacional e em Portugal (1962) pela “Portugália”. O seu livro “Poemas” só foi editado em 1998.
Dos poemas que deixou, Reinaldo Ferreira teve apenas um inscrito a bronze na sua lápide.
Mínimo sou,
mas quando ao Nada empresto
a minha elementar realidade,
o Nada é só o resto”.
REINALDO FERREIRA e “Uma Casa Portuguesa”
A canção criou uma polémica que muitos jornais exploraram até à exaustão. O sucesso cantado por Sara Chaves pela primeira vez, no Salão de Festas do Rádio Clube de Moçambique, em 1959, tem, diziam alguns cronistas, “versos que a conotam com a defesa de um espírito conformista face à pobreza”.
Outros não concordavam com este ponto de vista. Dizia-se que “não foi escrita por um propagandista do ruralismo ou do fatalismo lusitano, nem nasceu no Portugal profundo”. Foi escrita em África, num hotel cosmopolita de Moçambique, (Hotel Girassol) e nasceu de um episódio picaresco que reproduzo parcialmente, com a devida vénia, a partir dum texto de autoria de Nuno Pacheco, publicado no jornal “Público”:
“Certo dia, dois homens sentaram-se numa sala do Hotel Girassol, na antiga Lourenço Marques, hoje Maputo, hotel que ainda existe no mesmo local e com a mesma fachada, agora com o nome de Montebelo Girassol.
Ora os dois homens eram Reinaldo Ferreira (1922-1959), poeta, filho do célebre Repórter X e Vasco Matos Sequeira (1903-1973), filho do autor teatral Gustavo Matos Sequeira, que na altura se entretinham a fazer versos pornográficos.
Talvez porque achasse a coisa imprópria para o lugar, o maestro Artur Fonseca, ali presente, recordou aos dois divertidos amigos que estavam numa casa portuguesa, aviso que trazia um “respeitinho” implícito.
Reinaldo não se conteve e disse: “Ora aí está um bom título para uma canção”, ao que o maestro terá retrucado: “Com certeza”. E assim, na vulgar modorra de um hotel português plantado em África, nasceu a Casa Portuguesa. E seria o maestro Artur Fonseca, que na verdade foi involuntariamente o autor do mote (e do refrão), o autor da música.”
Clicar no vídeo seguinte:
Reinaldo Ferreira nasceu no dia 20 de Março de 1922. Se fosse vivo completaria hoje os seus 100 anos de idade.
Fonte: Arquivo do BigSlam – Texto de João de Sousa adaptado.
5 Comentários
Orlndo Rodrigues Valente
Reinaldo Ferreira, quis o destino que eu nao te conhecesse… Tinha 16 anos de idade, Mocambicano nascido na ILHA DE MOCAMBIQUE. Mas, acabo de ler algo sobre a tua pessoa que me tocou muito no intimo… a terra que te nos vio nascer, os momentos felizes que passamos, o calor das “gentes” que nos circavam, entrevam para nos, era a fortuna do nosso espirito que mantinhamos sempre felizes… Mauitos anos se passarm e nestes momentos de reflexao, sinto que estamos juntos e juntos continuaremos a falar e a vermo-nos com os olhos… sim, REINALDO FERREIRA, com os olhos DA NOSSA ALMA…
Recebe um abraco ESPIRITUAL e um ATE LOGO.
Orlando Rodrigues Valente
Manuel Martins Terra
Reinaldo Ferreira, foi sem margem para dúvidas um poeta impar e de imaginação fértil, com versos de profunda meditação. ” Uma casa portuguesa” de sua autoria, foi um sucesso quando transportado para o fado, que mereceu ser ser cantado desde Sara Chaves, até à grande Amália Rodrigues. Ouvia-se dizer em LM, que Reinaldo Ferreira, em noites de boémia, escrevia em guardanapos poemas de circunstância, que os seus companheiros da noite, guardavam nos bolsos e que provavelmente não chegaram ao conhecimento público. Foi também Reinaldo Ferreira, que chamou a Lourenço Marques, a cidade feitiço por quem todos se apaixonavam. A confirmar a sua visão, também Marcelo Rebelo de Sousa, nesta recente visita a Moçambique, sublinhou que aquela terra tinha feitiço, de tal forma que já prometeu neste verão mais uma escapadela à Pérola do Índico. Reinaldo Ferreira, partiu cedo mas deixou obra que merecia melhor divulgação. Um poeta irreverente, que será para sempre lembrado.
Carlos Guilherme
Tive um professor de Religião e Moral, no Liceu Pêro de Anaia, na cidade da Beira, que deu a conhecer a toda a turma a poesia de Reinaldo Ferreira. Fiquei completamente “conquistado”. De tal maneira isso aconteceu que o meu pai, no dia em que entrei na maioridade, me ofereceu o livro de Poemas cuja capa coincide com a que vem na vossa peça. Ainda o guardo religiosamente.
Carlos Guilherme
Sonia Matos
Poeta maior da sua geração e para sempre. Pouco falado, é unico entre os seus pares.
Maria Cristina Fonseca
Sem dúvida!