EFEMÉRIDE: 4 de Fevereiro de 1920… Moisés Ribeiro da Conceição, 101 anos de vida!
Desde a sua criação, a Orquestra Djambo toca com sentimento o quotidiano de um povo, suscitando um grande entusiasmo nos moçambicanos. E, diga-se, fá-lo com obrigação patriótica pois atravessou gerações e hoje é, sem dúvidas, uma das mais conceituadas orquestras do país.
“A Orquestra Djambo tem uma história longa”. Assim se expressou , Moisés Ribeiro da Conceição, um dos fundadores do agrupamento que começou por ser um conjunto e, depressa, se tornou uma orquestra, com sonoridades e ritmos moçambicanos.
Numa entrevista concedida ao jornal “A Verdade” Moisés passou em revista os altos e baixos do conjunto, que, com a devida vénia, transcrevo, por ocasião do centenário do líder do “Djambo”.
A paixão pela música sempre esteve presente desde miúdo na vida dos fundadores da Orquestra Djambo. Mas a história da orquestra começa nos princípios dos anos 50, logo após um indivíduo de nome Young Issufo ter adquirido alguns instrumentos musicais. E convidou Moisés, Orlando, Domingos, Hassane, Tiago, Zé Manel e Zé Mondlane para ensaiarem na sua casa.
Porém, depararam-se com um problema – o primeiro de muitos que o agrupamento teria pela frente: um dos elementos não se exercitava, neste caso Domingos Mabombo, porque não dispunha de um instrumento (piano). O Centro Associativo dos Negros da Colónia de Moçambique era o único que dispunha de um piano na época. Domingos, cujo pai era um dos sócios daquela agremiação, teve a ideia de pedir o espaço de modo a que todos os elementos do grupo pudessem ensaiar. Foi-lhes concedido o lugar e a banda começa a dar os seus primeiros passos.
Certo dia, Samuel Dabula, locutor da Voz de Moçambique, foi assistir a um dos ensaios do agrupamento, tendo ficado espantado com o virtuosismo que a banda apresentava e comunicou à direção do Centro que se preparava para organizar um baile na quadra festiva.
E o contrato para atuar não tardou a chegar, aliás, na madrugada do mesmo dia, receberam uma proposta para se apresentarem no Natal e no fim do ano. Recusaram-se a tocar na passagem do ano porque não queriam ficar “presos” à agremiação numa época em que surgiam novas propostas, mas aceitavam actuar nos próximos eventos.
“Sentimo-nos constrangidos por não termos satisfeito o pedido do Centro, uma vez que nos oferecia espaço para ensaiar e um dos elementos da banda era filho de um dos sócios”, diz Moisés.
O conjunto começa a ganhar forma e muita aceitação popular, mas ainda não tinha nome. Chamavam-no Conjunto de Young Issufo. Mais tarde, a banda atravessa um momento de crise. Young Issufo leva os seus instrumentos musicais e um dos elementos – Orlando – decide abandonar o agrupamento para tocar numa outra banda, mas os outros integrantes convenceram-no a não fazê-lo.
Apenas com piano, trompete, saxofone e trombone, o grupo de jovens músicos teve de conceber um plano para animar as noites de então cidade de Lourenço Marques. Surge a ideia de buscar a ajuda da direção do Centro. A agremiação prontificou-se a adquirir o material, mas os músicos iriam pagar mensalmente com o dinheiro de espetáculos. Assim, a banda ganhou forma novamente e começam os ensaios no mesmo local.
À procura de nome
O conjunto atuou em diversos locais da cidade de Maputo sem nome. “Quando sentimos que éramos maduros o suficiente, decidimos procurar um nome”, conta o decano da Orquestra Djambo. Cada integrante tinha de sugerir um nome, mas as propostas não colhiam consenso. Tempo depois, Domingos teve a ideia de batizar o conjunto de “Djambo”, inspirado num tema de um disco de música cubana denominado “Mambo Djambo”. Os restantes membros do agrupamento concordaram com a ideia, pois apreciavam a música, mas ninguém sabia o significado da palavra “Djambo”.
“Mais tarde, com ajuda de um brasileiro que sempre vinha assistir aos nossos ensaios ficámos a saber que Djambo quer dizer ritmo”, diz Moisés.
Na altura, existia um grupo musical com a denominação “Ritmo”. No entanto, optaram por chamar ” Conjunto Djambo” de modo a que não fosse confundido com a outra banda. Mais tarde, passou a denominar-se Orquestra Djambo, visto que tocavam instrumentos de sopro.
Depois de muito trabalho, o agrupamento caiu na graça do público. “As pessoas admiravam bastante o nosso trabalho. Éramos a única orquestra de negros que tocava a verdadeira música tradicional moçambicana, por isso, recebíamos muitos convites para atuar em bailes”, lembra.
Os anos que se seguiram não foram fáceis para o agrupamento. A orquestra teve de sobreviver a tudo: começando pela desistência de alguns membros. Com bilhete de passagem na mão, viu-se impedida de atuar no Brasil e outros países. Viu as portas do Centro Associativo dos Negros da Colónia de Moçambique – espaço que era o local de ensaios – a serem fechadas pela PIDE com todos os instrumentos no seu interior em 1965. A orquestra começou a dissolver-se.
Desde sempre, a Orquestra Djambo foi um dos mais importantes agrupamentos. Animava as noites e eventos sociais da capital com melodias arrebatadoras da marrabenta, xingombela, xigubo e nfena. Grande parte das composições era original. A orquestra também gravou um single com os sucessos “Elisa Gomara Saia”, “Bambatela Sábado”, “Laurinda” e “Xinwanana”.
Por volta de 1969, o agrupamento reaparece com alguns novos membros e uma nova denominação: Djambo 70. Mas esta “nova” orquestra não granjeou simpatia de um público habituado a uma marrabenta, com uma subtil mistura de pequenos insólitos da vida quotidiana e dos grandes eventos históricos, feita de sentimentos.”
A orquestra do povo está de parabéns. Um dos seus fundadores comemora hoje cento e um anos de vida. É sem dúvida uma efeméride!
Não deixes de ver o vídeo seguinte onde a lucidez de um “jovem ancião” é fascinante!!!
Parabéns Moisés!
Fonte: Arquivo do BigSlam – Texto de João de Sousa adaptado.
6 Comentários
Manuel Arnaldo dos Santos Silva
Obrigado Moisés da Conceição pelo teu exemplo de vida, que o mesmo sirva para as futuras gerações.
Um abraço de parabéns.
Manuel A. dos Santos Silva.
( Natural e residente em Maputo, desde 1943.)
João Alberto Ferreira Silva
Na foto do programa emitido directamente da montra da SUT, lançamento do novo cigarro CABORA BASSA estou com o João Sousa (infelizmente falecido há dias) e o António Luís Rafael. Mando-lhe daqui um abraço de parabéns pelo seu 88°aniversário. Alberto Ferreira
António Amorim Lopes
PARABÉNS AO GRANDE “JOVEM” MOISÉS DA CONCEIÇÃO E A QUANTOS O ACOMANHARAM NA SUA FELIZ ODISSEIA HONRANDO MOÇAMBIQUE, ESSA ENORME E MISTICA TERRA AFRICANA, DE QUE TEMOS IMENSAS SAUDADES.
Augusto Martins
Cento e um anos de vida não é para qualquer um.
É com um especial prazer que felicito este HOMEM, a quem todos nós devemos muitas e muitas das maravilhosas recordações do nosso Moçambique.
Paraíso nosso, dele próprio e de tantos outros a quem, ao ouvir o som das primeiras notas das suas músicas, farão brotar nas suas memórias, até ao fim das suas vidas, as imagens, as cores, o abençoado perfume das quente chuvadas de verão, as suas inocentes brincadeiras de criança, as travessuras das suas juventudes, os sonhos que povoaram os seus pensamentos ao ouvirem os seus ritmos dolentes e inebriantes que lhes falam e caracterizam o paraíso em que tiveram a felicidade de nascer e viver.
Por toda essas razões eu presto-lhe a minha homenagem e o meu agradecimento, desejando que tenha um maravilhoso dia de aniversário, cheio de saúde, alegria, boa disposição e, por muitos mais anos, a lucidez manifestada na entrevista que tive o grato prazer de acabar de ouvir.
Samuel Carvalho
Grato Augusto Martins pelo teu comentário. Reflete o pensamento da maioria da malta que lá viveu. A lucidez demonstrada na entrevista também me deixou de boca aberta… excelente!
Manuel Martins Terra
Parabéns ao Moisés da Conceição que comemora a linda idade de 101 anos, um grande interprete da Marrabenta e de quase todas as matrizes da música moçambicana. Que continue a somar mais anos , com muita saúde e na companhia da família, amigos e das suas inseparáveis melodias.