5 de Maio de 1948 … Cine Teatro Manuel Rodrigues
Manuel Augusto Rodrigues chegou a Moçambique no final do Século XIX. Jovem de 27 anos, transmontano de Bragança, apostava numa vida melhor que em Portugal não conseguiria.
Na então Lourenço Marques começou por se empregar no comércio, mas não levou muito tempo até trabalhar por conta própria. O sonho empurrava-o para grandes projectos. Nos horizontes via o cinema e o teatro modernos como descreviam notícias vindas de longas distâncias.
Em 1907 inaugurou o seu primeiro cinema. O Salão Edison surgiu exibindo filmes que noutros mundos tinham conquistado outros públicos, não tardando a ter o seu palco alargado para permitir espectáculos de teatro amador.
Sentindo que o espaço disponível não lhe permitia trazer a Moçambique as grandes companhias que despontavam em Portugal, o esclarecido empresário foi amadurecendo a ideia de um teatro à dimensão do seu sonho. Manuel Rodrigues assumia assim a “paternidade” do Teatro e do Cinema moçambicanos.
A 10 de Março de 1944, com 74 anos, Manuel Augusto Rodrigues teve a sua caminhada de sucesso interrompida por uma fragilidade do coração. Aos seus filhos, César e Manuel, caberia continuar a obra.
A SALA DE CINEMA E DE ESPECTÁCULOS
Foi uma das salas emblemáticas da então cidade de Lourenço Marques. Por ali passaram actores e actrizes que, na tela, nos transportavam para o mundo mágico da sétima arte. Ali vimos Bernardo Bertolucci no seu “Último Tango e Paris”, “Ben Hur”, “The Godfather” e tantos outros clássicos.
Por ali passaram vozes e conjuntos de sucesso da época, como foram os casos da espanhola Marisol, que veio a Moçambique para apresentar o seu filme intitulado “Tômbola”,
da portuguesa Madalena Iglésias que se fez acompanhar pelo conjunto de Renato Silva,
da Companhia de Teatro de Vasco Morgado, da Orquestra sinfónica da SABC (South Africa Broadcasting Corporation) ou ainda da orquestra americana de jazz, de ERBIE MANN, que introduziu a flauta num conjunto típico de saxofones, trompetes e clarinetes.
O “Manuel Rodrigues” que depois passou a chamar-se “África”, foi palco de múltiplas realizações importantes do pós independência de Moçambique, sendo de destacar a actuação de várias vozes nacionais ou estrangeiras (destaco Miriam Makeba na Sessão de Gala de 25 de Junho de 1975),
a apresentação de várias peças da nossa prestigiada Companhia Nacional de Canto e Dança ou ainda dos programas ao vivo da finalíssima do “Ngoma Moçambique”, a parada anual de canções da RM, a nossa estação pública de radiodifusão.
A última vez que entrei no “África”, (creio que em 2015) foi quando fui convidado a apresentar um espectáculo de homenagem ao nosso cantor e compositor Gabriel Chiau que na ocasião foi acompanhado pela sua banda “Kwekwety”. Fiquei desolado com o seu estado de abandono e consequente degradação. E esse estado de degradação, acredito que continua. A pouco e pouco o nosso património vai-se deteriorando.
O Cine-Teatro Manuel Rodrigues (hoje designado de Cine Teatro “África”) foi inaugurado no dia 5 de Maio de 1948. Já lá vão 72 anos.
João de Sousa – 05.05.2020
11 Comentários
Zé Carlos
A minha casa de espetáculos regular foi durante muito tempo o Nacional ao lado da Casa das Beiras na Av. 31 de Janeiro, porque era perto de casa.
Para o tamanho de LM, havia muita escolha em termos de casas de espetáculos.
Frenquentei muitos cinemas, o Avenida, Gil Vicente, Infante, Scala, 222… geralmente íamos em grupos entre seis e doze amigos…
Quando o Dicca abriu a malta começou a ir lá porque estava na moda.
Na minha humilde opinião, em termos de luxo, conforto e espaço o São Miguel era o mássimo… Mas em estreias de grandes filmes e shows, capacidade bruta, qualidade de som e ecrãn, boas cadeiras etc, o Manuel Rodrigues estava à frente.
Grande e escrupoloso empresário foi o Sr. Manuel Rodrigues.
Adelino Silva
Quanto ao comentário apresentado por ABM segundo sei (posso estar errado), mas sempre ouvi dizer que o Varietá era do dono da fábrica de cervejas Laurentina O srº Dicca ,por esse motivo quando foi construído os Cinemas Dicca e estúdio 222, foi esse o nome dado a essa sala de espectáculos.As lojas que se encontravam no local eram lojas da firma Dicca.
Espero que esteja certa a minha informação.
Espero que me não tenha levado a mal esta minha observação.
Adelino Silva
wanda serra
Muito obrigada Cesar
So mesmo tu como neto do velhote Manuel Rodrigues e filho de Cesar Rodrigues
Poderias dar com precisao a lotacao do Manuel Rodrigues ,Gil Vicente e Infante .
Tempos maravilhosos…..
Beijinhos muitos xxxx
WANDA SERRA
Cesar Azevedo Rodrigues
O Manuel Rodrigues tinha 1500 luqares sentados, o Gil Vicente 1,280 e o Infante 1,000. Todos da familia Rodrigues. Sou neto do velho Manuel Rodrigues
Nino
Eu perdi tudo de LM, Perdi TODOS os (centenas) de amigos quando tive que partir(fugir) para a França em 75 , aonde refiz a minha vida,Mas nunca deixei de ser de Lourenço Marques, minha terra
Nino Ughetto
eu sou o Nino ughetto ,que tristeza recordar o bom passado, mas… tudo passa tudo acaba bjss para meus amigos de lourenço Marques
Adelino Manuel Brito Silva
A minha Mãe contava-me muitas vezes que quando eu nasci na casa de saúde da Maxaquene a 15 de Abril de 1948, o cinema Manuel Rodrigues andava em experiências de som e dias depois era inaugurado com pompa e circunstancia.
Grandes filmes que por lá passaram era uma sala muito bonita , a última vez que o vi ao vivo foi a 15/4/2013, pois tirei uma foto junto da casa de saúde onde nasci, depois assustei-me pois lá é um lar das fplm.
Adelino Silva
Milu Gouveia
Interessantissimo, gostei muito de conhecer a historia do cinema Africa.
Ernesto Silva
A descrição do ABM está perfeita, concordo plenamente. Obrigado ao Bigslam por nos presentear com tantos e bons trabalhos.
ABM
Sejamos optimistas. Enquanto o edifício, que tem valor histórico e patrimonial, não fôr abaixo, pode sempre vir a ser restaurado. Talvez daqui a cem anos. Nem que seja daqui a cem anos.
Talvez por distracção ou economia (só pode) o Grande João omitiu a etapa dos Gil Vicentes 1 e 2. O Teatro Gil Vicente original ficava situado na entrada à direita da antiga Rua Joaquim da Lapa (agora com o nome dum proeminente Libertador sul-africano, será o Jos Slovo?) onde agora fica a Papelaria Académica e parte do Prédio Fonte Azul. Inaugurado em 1907, ardeu em 1929. O seu concorrente directo era o Varietá dos Buccelatto, que era mais ou menos a mesma coisa mas mais ao estilo das casas de ópera italianas. Em 1932 Rodrigues inaugurou o segundo Gil Vicente que (ainda) fica na Avenida Aguiar, depois Avenida D Luiz e agora Avenida Marechal Samora Machel. Ao contrário do primeiro, que era um pouco um salão mais ou menos modesto ao estilo das casas de espectaculo da altura, com ventoinha e mata-moscas, o segundo era um nadinha mais confortável e um exemplar exímio de Art Deco.
O Manuel Rodrigues tinha a distinção de ser maior e mais moderno, com cadeiras confortáveis, potentes aparelhos de ar condicionado, podendo passar filmes com várias bandas de som e com um ecrã que comportava, mais tarde, Cinemascope e Panavision (padrão 16:9 que, muito mais tardiamente, foi adoptado pelos televisores actuais). Memorializando, lá vi 2001: Uma Odisseia no Espaço e Jesus Christ superstar. Depois veio a Frelimo e eu decidi ir estudar para Coimbra.
Abraço
ABM
Manuel da Silva
“Teatro Manuel Rodrigues em LM”
Uma viagem no tempo do bloguista do BigSlam – João de Sousa. A não perder!
E eu não perdi! Obrigado João de Sousa e BigSlam
Parabéns por mais esta memória.