IN MEMORIAM!
Quis o destino que aos 80 anos de idade, Manuel Jorge partisse. É assim a vida. Ele foi um dos mais competentes e respeitados dirigentes deste País. Mas antes disso, um desportista (futebolista) de mão cheia. Ou de pé cheio, se quiserem. Dos bons e velhos tempos dum futebol jogado pelo amor à camisola.
Não vi Manuel Jorge jogar. Mas dele e do seu comportamento em campo ouvi histórias interessantes, algumas delas contadas pelo seu grande amigo e companheiro de equipa nos “alvi-negros”, José Júlio de Andrade. Histórias contadas à mesa dum café, no Shoping Polana, ali para as bandas da Avª 24 de Julho, onde se juntavam alguns “maduros” do seu tempo e de tempo mais recente. Aos sábados (e não só) falávamos sobre tudo. Púnhamos, como o saudoso Nino Carrilho costumava dizer “a escrita em dia”. Devo confessar que não era um participante assíduo desses encontros, pelo facto de ter estado a viver e a trabalhar na África do Sul durante 6 anos como Correspondente da Rádio Moçambique.
Uma das vezes, vindo eu de férias, fui arrastado pelo Nuno Narcy para a tal amena e construtiva cavaqueira de sábado. E ao chegar ao local fui saudado pelo Manuel Jorge duma maneira muito diferente do habitual: chegou o “boer”. Era eu. E de mim ele queria saber notícias dos nossos jogadores de futebol que militavam nas equipas sul africanas. Interessava-se particularmente por Dominguez, que no seu entender “devia jogar numa equipa europeia”, porque afinal tinha condições e capacidade para isso.
De Manuel Jorge ficam-me gratas recordações. De algumas viagens que fizemos juntos.
Manuel Jorge e João de Sousa à saída duma reunião da Assembleia Geral da CAF, no Cairo, em 1986
Ele como dirigente da FMF e eu como jornalista, sendo que a mais marcante foi sem dúvida a realizada em 1986, quando pela primeira vez a Selecção de Moçambique participou numa fase final da Taça das Nações, no Cairo, e onde perdemos os 3 jogos disputados (0/2 frente ao Egipto, 0/2 diante do Senegal e 0/3 no confronto com a Costa do Marfim). Sofrer 7 golos e não marcar um único tento, fez história, na história dos altos e baixos dos nossos “mambas” que ao tempo de Manuel Jorge ainda nem sequer sonhavam em ser essa serpente africana e venenosa.
Nessa Taça das Nações, eu, o Jorge Matine e o fotógrafo Domingos Elias fomos integrados na comitiva moçambicana como representantes da Rádio Moçambique e do jornal “Notícias” responsáveis pela cobertura do acontecimento. Foi nesse período que convivemos mais de perto com Manuel Jorge. No hotel onde nos encontrávamos hospedados, nas sessões da Assembleia Geral da Confederação Africana de Futebol (CAF), realizada dois dias antes do início da Taça das Nações ou no Estádio Nacional do Cairo, onde Moçambique realizou as suas 3 partidas. Falávamos de futebol e das coisas do desporto em geral. Lembrar hoje Manuel Jorge é lembrar o dirigente que em vida foi um dos que deu o seu contributo para que Moçambique inscrevesse oficialmente o seu nome na FIFA e consequentemente pudesse participar nas competições oficiais do nosso Continente.
Na cidade do Cairo, João de Sousa na companhia de Manuel Jorge (Presidente da FMF), Ibrahim Bamgee (Botswana) e Jorge Matine (Jornal Notícias).
Partiu um amigo. Um desportista. Que os valores que deixa como legado, tais como honestidade, dedicação, compromisso com o seu País, empenho e alto sentido de responsabilidade, possam ser seguidos pela nova geração de praticantes e dirigentes. Não só do futebol, porque afinal Manuel Jorge foi muito para além do chamado “desporto-rei”.
João de Sousa – 19-09-2014