O décimo quarto salário
O meu amigo Jossias, sindicalista de gema, que um dia viveu na Malhangalene e depois repentinamente, não se sabe bem por que artes mágicas, passou a viver numa mansão na Sommerchield, um dos bairros chiques de Maputo, anda em campanha eleitoral. Quer sentar-se numa cadeira que provavelmente lhe está reservada, no Conselho de Administração duma Empresa Pública local. Quer ser o Administrador eleito pelos trabalhadores. É um direito que lhe assiste. Está na lei. E por isso faz campanha. Coloca cartazes no interior da instituição onde trabalha. Enche as paredes com fotografias suas. Cita artigos da Constituição. Tudo serve para convencer o eleitorado. É preciso chegar ao primeiro andar e por isso faz promessas. No seu “manifesto eleitoral” consta a atribuição aos trabalhadores da empresa, caso seja eleito, do décimo quarto salário.
Já há muita gente a esfregar as mãos de contente. Mas há também (se calhar a maioria) os que colocam um pé atrás porque afinal “quando a esmola é grande o pobre desconfia”. Este décimo quarto salário seria entregue ao trabalhador no dia do início das suas férias. Seria ouro sobre azul. Só que de utopias e irrealismos anda o mundo cheio.
Na empresa onde Jossias trabalha nunca tinha acontecido este fenómeno. Nunca nenhum colega seu, em mandatos anteriores e em campanha para Administrador eleito pelos trabalhadores, prometeu tão chorudo bónus. Para desfazer dúvidas alguns trabalhadores mais atrevidos decidiram perguntar ao Presidente do Conselho de Administração, como é que isso ia ser feito, sabido que é que a instituição pública onde Jossias trabalha “não tem dinheiro nem para mandar cantar um cego”. É uma empresa que, para o seu funcionamento normal, depende do subsídio mensal que o Governo lhe concede. Empresas bem mais rentáveis do que aquela onde trabalha o meu amigo Jossias nunca institucionalizaram o décimo quarto salário, por terem a noção exacta de que isso representaria um suicídio financeiro.
Jossias é sindicalista. Quando chegou ao posto que ocupa actualmente como sindicalista-mor que é, nunca se lembrou do décimo quarto salário. Agora que enceta esta corrida para Administrador, lembrou-se de oferecer aos seus colegas este rebuçado. O caricato da questão é que Jossias sabe perfeitamente que a sua proposta não é exequível. A menos que não tenha os pés bem assentes no chão ou queira atirar a sua empresa para a bancarrota. Ele sabe que promete e não vai poder cumprir. Copiou de outros esta forma de ludibriar. É a estratégia da caça ao voto. Assim que se sentar no cadeirão da Administração da sua empresa, vai ignorar tudo e todos.
Mas aí, como já referi em crónica anterior, pode ser que Jossias, o zeloso sindicalista, trabalhador duma empresa pública e candidato a Administrador se torne no Odorico Paraguaçu, o político corrupto e oportunista que na sua campanha eleitoral para presidente do município prometeu inaugurar um cemitério. E de facto inaugurou, porque foi ele o primeiro cidadão da cidade fictícia de Sucupira a ser enterrado nesse cemitério. De vilão passou a mártir. Virou-se o feitiço contra o feiticeiro.
João de Sousa – 23.04.2014
Um Comentário
Dave Adkins
A maioridade da gente aquí não acredita os politicos como em Moçambique “o amigo Jossias” do João de Sousa, inclusivo o nosso amigo,# 1, o zeloso socialista, o organizador da comunidade, o Sr. Barack. Verdade.