VERBOS FORA DE PRAZO
Justiça pelas próprias mãos é sinónimo de descrédito. Já não se acredita nas instituições, especialmente as vocacionadas para manter a ordem pública, segurança e tranquilidade. Arrombar, assaltar, violar, bater, torturar, violentar sexualmente, “engomar” enfim … verbos cujo prazo de validade já devia ter terminado. Verbos utilizados por membros dum alegado G20 ou dum outro grupo qualquer. Bem podia ser 30 ou 40, como refere o Professor Carlos Serra num escrito intitulado “patrulheiros da dignidade humana”. Verbos que lembram o inadmissível. E o inadmissível confronta-se com a tranquilidade que tanto desejamos.
Como se não bastasse querem inculcar nas nossas cabeças de que tudo não passa dum boato. E agora ? Como encontrar o boateiro ? Onde estará ? Onde se escondeu ? Ninguém sabe, ninguém viu. Mas o boateiro, que devia estar atrás das grades a cumprir de 2 a 8 anos de cadeia, deve estar a esta hora a passear a sua classe algures por aí. Se calhar de fato e gravata. Sentado num desses cafés ou bares onde se discute de tudo um pouco. Da política ao negócio e onde, sabe-se lá, se planificam essas acções vergonhosas que assaltam o nosso quotidiano.
Num dos bairros periféricos da cidade da Matola encontrei a semana passada vários “patrulhadores”.
10 da noite, de chamboco na mão. Paus e pedras amontoadas num cantinho para o caso de necessidade. Alguns com os apitos entre os dentes, preparados para o que der e vier. Apitar para afugentar o ladrão ou para assinalar a existência de perigo. E como resposta a justiça pelas próprias mãos. Inaceitável, porque na confusão paga o justo pelo pecador. Assim aconteceu com Alexandria. Esculpiu o seu próprio destino, quando confundido com malfeitores. E a continuar esta saga, outros Alexandrias podem seguir pelo mesmo caminho. Mas não é isso que se pretende. Pretende-se respeito pela vida humana.
Nunca é demais lembrar que Alex Simões Ferreira, mais conhecido como Alexandria, nascido a 8 de Dezembro de 1978, em Maputo.
Aos 12 anos já vendia, juntamente com o seu pai, o escultor Simões, peças de sua autoria, na Praça 25 de Junho, em Maputo.
Nas suas obras usava madeira, pedra sabão e metal.“Jinga, a última viagem para o céu” foi uma das peças que criou alguma polémica, devido a uma discordância entre a “Plural Editores Moçambique” e o artista, por desrespeito da Propriedade Intelectual. Esta peça pode ser apreciada na capa do livro da disciplina de Educação Visual da 9ª classe do ensino secundário geral.
Alexandria era membro do Núcleo de Arte em Maputo e da associação denominada “Lattice” que liga professores de varias áreas educacionais nos Estados Unidos da América. As suas obras estão representadas em várias colecções públicas e privadas em Moçambique e no estrangeiro.
Na noite de sábado, 10 de Agosto, Alexandria deixou de esculpir. O linchamento popular deitou por terra o muito que ainda tinha para nos dar.
João de Sousa – 21.08.2013