ESTÁDIO DA MACHAVA
Não fossem as cerimónias centrais deste 25 de Junho e o Estádio da Machava continuaria como está. A cair aos bocados, sob a incómoda e aparente complacência do seu dono.
Agora, numa lufa-lufa ao estilo contra-relógio, e que ultimamente parece estar a tornar-se preocupante cultura entre nós, de fazer inveja a Eddy Mercks e a tantos outros ciclistas de renome mundial, operários moçambicanos dos mais variados sectores descarregam o seu saber sobre o Estádio que na noite de 24 para 25 de Junho de 1975 era outro.
Colocam-se remendos em tudo quanto é canto e sítio para dar um aspecto novo ao emblemático recinto que foi sonho de muitos ferroviários, liderados por um engenheiro de seu nome Sousa Dias (faleceu 27 dias depois da inauguração) e que se tornou realidade a 30 de Junho de 1968.
Naquele tempo todos os caminhos iam dar ao Estádio Salazar. A independência provoca uma mudança no nome. Por estar localizado na Machava, o Estádio leva o nome do bairro.
É um autêntico “ex-libris” do nosso País. À altura da sua inauguração alguns o apelidaram de Wembley ou Maracanã da Província Ultramarina Portuguesa.
Ali se realizam coisas memoráveis. A proclamação da independência, a abertura oficial dos primeiros Jogos Escolares, as grandes partidas de futebol, do campeonato nacional, da Taça, da nossa selecção nacional que por sinal ainda não sonhavam (e ainda bem) em ser “mambas”. Ali os Camarões foram derrotados por três bolas a zero. Ali José Magalhães acendeu a Pira Olímpica, que de Pira fica apenas o nome.
Ali correu Horácio Sucena. Ali actuaram vários nomes da música nacional, regional e internacional. Lembro-me, entre muitos, de Eric Clapton, nessa iniciativa do empresário Aurélio Le Bon. O estádio era uma das nossas imagens de marca.
Agora, infelizmente, já não é. O tempo não perdoa. As fissuras começaram a aparecer. Ninguém se interessou nem tão pouco há sinais de interesse por parte de quem se diz responsável por aquele empreendimento.
O espaço de 31 hectares no Vale do Infulene, projectado para Estádio, balneários e Centro de Estágio, (este último pensado mas não concretizado) anda entregue à sua própria sorte. Já é espaço ocupado por malandros da zona que por ali decidem acampar e fazer das suas. Aquilo que era o nosso emblema desportivo caminha a passos largos para a destruição total. Virou imundície. Sofremos a dor de, impotentes, nada podermos fazer para travarmos a caminhada lenta e irreversível de um ente querido para a morte.
Como refere uma postagem que se encontra publicada na internet, num portal do Clube Ferroviário “Machava, no lugar de Salazar, foi o único benefício que o estádio teve no período pós-Independência! O resto, é a imagem desoladora que o empreendimento apresenta. Pelo seu actual estado, nem parece que foi ali o local da proclamação da Independência Nacional, para a qual muito contribuiu a classe dos trabalhadores dos Caminhos de Ferro que ali erguerem mais uma obra que simbolizava o orgulho dos moçambicanos e a grandeza patrimonial do maior e o mais abrangente sector produtivo de sempre – os Portos, Caminhos de Ferro e Transportes de Moçambique.”
Amanhã, quando o povão tomar lugar na bancada, vai ficar maravilhado com um outro aspecto (remendado) do estádio. O pior vai ser quando o verniz estalar.
João de Sousa – 24.06.2015
One Comment
José manuel Mota.
Uma crónica que me emociona, João de Sousa!
O meu pi era inspector dos CFM e amigo pessoal do Eng. Sousa Dias. Tive a oportunidade e o privilégio de ir visitando o estádio ao longo do período de construção, em passeios de fim-de-semana com o meu pai e o Eng. Sousa Dias, sendo por isso testemunha do entusiasmo que ele colocou nesta “sua” obra e o orgulho que sentia dela.
Ainda guardo com cuidado e carinho o bilhete do jogo Portigal-Brasil a que tive a sorte de assistir no dia da inauguração do estádio.
Porém, já não estive lá na cerimónia da Independência de Moçambique. Mas, sinceramente, na altura gostaria muito de ter podido estar presente. Hoje, … não sei se teria saudades e boas recordações dessa data …!!!
Abraços.